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Cultura organizacional

6 min de leitura

Cinco especificidades (curiosas) do mercado de trabalho americano

Divulgação da faixa salarial, desclassificação de fumantes e horas extras mandatórias são alguns dos curiosos achados entre as 200 vagas de emprego dos Estados Unidos analisadas em dissertação de mestrado

Colunista Bruna Gomes Mascarenhas

Bruna Gomes Mascarenhas

26 de Setembro

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Artigo Cinco especificidades (curiosas) do mercado de trabalho americano

Antes de tudo: por que alguém pararia para ler 200 vagas de emprego? Tédio? Muito amor pela arte de escrever anúncios de vagas? Curiosidade somada a muito tempo livre?

Explico: essa leitura fez parte da minha dissertação de mestrado. Pois é. Ler todas essas descrições de vaga foi cansativo, foi chato, foi desafiador e foi CHATO. Mas também foi muito interessante. Além de ter feito eu entender melhor o que outros mestrandos falam sobre amor e ódio caminhando juntos no processo de pesquisa, esse processo rendeu aprendizados e reflexões sobre algumas práticas que descobri pelo caminho.

As 200 vagas que analisei foram divulgadas por empresas dos Estados Unidos, especificamente as 20 primeiras colocadas no ranking 2023 da Fortune 500, que classifica as maiores empresas do País por receita. A razão pela qual eu não optei por fazer esse exercício com organizações brasileiras é que toda a documentação da dissertação precisa ser entregue em inglês, então, captar as vagas já em inglês facilitou o processo. Quem sabe um dia, quando eu retomar o fôlego, possa fazer um exercício parecido com empresas daqui?

Para quem tem familiaridade com as leis trabalhistas dos Estados Unidos, alguns desses pontos podem não ser novidade.

1 - Divulgação de faixa salarial

Eu já sabia que algumas empresas nos Estados Unidos divulgam faixas salariais nos anúncios de vagas, mas nunca tinha parado para pesquisar a lógica por trás disso. Acontece que a obrigatoriedade dessa divulgação varia entre estados, condados e cidades. Tudo começou em 2021 no estado do Colorado e, desde então, alguns outros estados como Califórnia, Rhode Island, Connecticut e Washington, entre outros, tornaram obrigatório que empregadores divulguem as faixas de salário em qualquer vaga, valendo para posições em tempo integral, em que os salários são divulgados pelo valor anual; e para posições remuneradas por hora trabalhada.

Alguns estados requerem a divulgação dos salários para empresas de qualquer porte; outros, apenas para empresas com mais de 15 funcionários. De acordo com o portal MSN, até o final de 2023, um em quatro americanos serão cobertos por uma lei local ou estadual que demanda que empregadores sejam transparentes sobre suas faixas salariais. A mesma fonte sugere que esse tipo de divulgação mandatória pode ajudar a reduzir as lacunas de remuneração que atingem principalmente grupos minorizados.

A informação sobre a faixa salarial geralmente é acompanhada de um texto explicando que a decisão sobre o salário final será tomada de acordo com a formação e a experiência prévia do candidato. Para posições remotas, é comum também ver duas faixas salariais na vaga: a padrão e uma outra, mais alta, para quem mora nas cidades de Nova York e São Francisco, aparentemente por causa dos custos de vida mais elevados nesses lugares. Um tema similar que já acompanhei no Brasil tem a ver com o vale-refeição, que às vezes é padronizado na empresa e tem o mesmo valor para quem trabalha em cidades pequenas e para quem trabalha em grandes centros e encontra custos mais altos para a alimentação fora de casa.

HSM 1

Um exemplo de vaga com divulgação de faixa salarial geral e faixa específica para São Francisco e Nova York.

2 - Fumantes desclassificados

Essa foi bem diferente e me surpreendeu. Uma das empresas que analisei é da área de saúde e informa em todas as vagas que adota uma política antitabagista, reservando o direito de não contratar usuários de tabaco/nicotina em estados em que é permitido fazê-lo. A organização informa também que fumantes serão desconsiderados em processos seletivos, a não ser que aceitem entrar em um programa de tratamento do tabagismo antes de começarem no emprego. A imagem a seguir traz o texto original, bem como a lista dos estados que permitem que as empresas considerem o tabagismo como critério eliminatório. Fiquei pensativa com a imagem abaixo porque no anúncio completo, esse texto que detalha a recusa a fumantes vem logo depois de um parágrafo que destaca as práticas de diversidade, equidade e inclusão da empresa.

HSM2

Vaga com informações sobre a política antitabagista da empresa, que inclui excluir fumantes dos processos seletivos em estados em que isso é permitido.

3 - Possibilidades para a candidatura de PCDs

Em vagas brasileiras, já vi muitas empresas finalizando as postagens com algo na linha de “incentivamos (grupos minorizados) a se candidatar a essa vaga #diversidade”, sem detalhamento sobre possíveis adaptações no processo para que pessoas com deficiência, por exemplo, possam participar das etapas de seleção.

Em todas as vagas que analisei durante o estudo, além de existir a comunicação de que a empresa oferece oportunidades de forma igualitária, há sempre uma mensagem reforçando que se o candidato tiver alguma necessidade específica para poder participar do processo seletivo, ele pode entrar em contato com a organização (geralmente por meio de um e-mail) solicitando as adaptações necessárias, que serão feitas desde que previstas no documento “Americans with Disabilities Act”. É interessante notar que existe um canal aberto para que a pessoa entre em contato, demonstre interesse e discuta eventuais adaptações.

HSM3

Exemplo de informação sobre adequações para que PCDs possam participar do processo seletivo.

4 - Expectativa tempo x atividades

Sabe quando você acha que vai passar a maior parte do tempo no trabalho fazendo as atividades A e B e descobre – tarde demais - que elas são a exceção no seu dia a dia? Em algumas das vagas que analisei, o empregador detalha a distribuição esperada de tempo entre as principais responsabilidades do cargo, como no exemplo da imagem abaixo. Não é nada muito específico, mas achei interessante por dar uma ideia de como a pessoa vai dividir o tempo.

HSM4

Vaga com detalhamento de distribuição esperada de tempo entre as principais responsabilidades do cargo.

5 - Horas extras mandatórias

Em algumas vagas, notei observações sobre “mandatory overtime may apply”, algo como “horas extras mandatórias podem ser necessárias”. Fui entender melhor o contexto e vi que o Fair Labor Standards Act (FLSA), algo como nossa CLT por aqui, estabelece que a semana de trabalho tenha 40 horas, mas não coloca limites no número de horas que os empregadores demandem de seus empregados.

Na maior parte dos casos, essa prática é legal desde que o empregador cumpra alguns critérios, como pagar 50% a mais pela hora extra trabalhada, garantir que as horas extras não coloquem o trabalhador em perigo e garantir que as horas extras não firam nenhum acordo sindical, no caso de grupos ocupacionais sindicalizados. Fiquei me perguntando se empregadores podem forçar os empregados a fazer hora extra e a resposta é sim. Além disso, eles podem demitir um funcionário que se recuse a fazer hora extra quando solicitado.

HSM5

Trecho de vaga com a mensagem “durante períodos de pico, o empregador pode solicitar aos empregadora que trabalhem horas extras”.

Vocês já conheciam essas especificidades do mercado de trabalho dos Estados Unidos? Acham que alguma dessas práticas poderia ser adotada por aqui? Aprendi bastante nesse processo e em um próximo artigo trago mais “achados” dessa empreitada.

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Autoria

Colunista Bruna Gomes Mascarenhas

Bruna Gomes Mascarenhas

Atua como consultora em projetos de comunicação, employer branding e gestão da mudança pela Smart Comms, empresa que fundou em 2016. Pós-graduada em marketing (FGV), graduada em comunicação (Cásper Líbero) e mestranda em psicologia organizacional (University of London), atuou por 13 anos nas áreas de comunicação e marca em empresas como Johnson&Johnson, Unilever, Touch Branding e Votorantim Cimentos. É professora do curso livre de employer branding da Faculdade Cásper Líbero, um dos primeiros do Brasil, autora de artigos sobre o tema em publicações brasileiras e internacionais e co-autora do livro Employer Branding: conceitos, modelos e prática.

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