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Desenvolvimento pessoal

8 min de leitura

O VUCA foi BANIdo, ou melhor, BANIzado. E isso é bom!

Fragilidade, ansiedade, não linearidade e incompreensão marcam o período atual; ou melhor: semelhanças com as tragédias gregas no moderno mundo corporativo não são coincidências, pois tudo isso, no passado e no presente, representa o ser humano

Colunista Adriano Lima

Adriano Lima

14 de Fevereiro

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Artigo O VUCA foi BANIdo, ou melhor, BANIzado. E isso é bom!

Desde que nos entendemos por humanos, temos a mania de explicar tudo. Antes de compreendermos como o som se reverbera, alguns atribuíram a um amor não correspondido a origem do eco.

Quando a bela ninfa Eco se apaixona, um dia, por Narciso e por ele é rejeitada — uma vez que o moço só tinha olhos para ele mesmo —, começa a se definhar até sobrar apenas sua voz, que ficava nos vales e montes repetindo o que outras pessoas diziam.

No entanto, o que essa versão desse mito grego, dentre outras, tem a ver com o mundo corporativo? Nada ou tudo. E é nesse ponto que está o eco mais sobressalente e ruidoso.

Para você que lê e que se preocupa com sua carreira ou com seu negócio, uma dica: espero que algumas reflexões presentes neste texto, digamos, ecoem em sua cabeça. Espero ainda que essas reflexões sejam traduzidas em novas histórias, de preferências reais, inspiradoras e transformadoras.

Sopa de letrinhas

Até pouco tempo atrás, os “delfos” corporativos orientavam os mortais que a eles chegavam cheios de dúvidas com um acrônimo, o VUCA. “As coisas estão muito voláteis? Não se preocupe. É assim mesmo”, respondiam. “Incerto e complexo? Faz parte.” “Ambíguo? Nem se fale!”

A partir da constatação de que o mundo corporativo se encaixava ou era traduzido da forma melhor possível por essas quatro letras, cabia a todo líder ou gestor de pessoas a tarefa de se preparar para auxiliar as demais pessoas a não se perderem muito em meio a tantas siglas no mercado. Era VUCA, EBITDA, B2B, MVP, KPI...

Retomando os gregos neste texto, agora com a história do Minotauro, imagino que muitos “teseus” usaram nas empresas uma ligação com o passado como o fio de Ariadne (que salvou o herói original a sair do labirinto). Essa leitura possível, a de que estão presos a um passado ou a algo que o traz de volta, era a maneira de encarar e vencer os desafios com corpo humano e cabeça de touro que nos espreitam.

Quantos profissionais se prendem ou se enroscam com essa linha ao longo de sua jornada? Quantas empresas não tropeçaram nela? Quanto não perdemos em termos de aprendizado tentando puxar soluções, como se saíssem de um novelo, numa série de causa e efeito?

O mundo VUCA era como se traduzia o fato de que nada mais seria como antes. Uma onda de incertezas ganhava corpo em mares não muito distantes e já mexia em muitas praias, em muitos continentes. A mudança vinha com força, a disrupção era o passo mais óbvio para empresas e pessoas. “Decifra-me ou te devoro” agora era “pivota que é melhor, parceiro!”

Nus no meio da tragédia

No entanto, o ambiente volátil, incerto, complexo e ambíguo também tem seu período de mudanças. A pandemia de covid-19 foi um tsunami que levou as poucas certezas que tínhamos, e trouxe os irmãos Fobos (deus grego do medo) e Deimos (o do terror).

Modernamente, imagino que esses deuses confabularam para aumentar um dos males dos últimos tempos: a ansiedade. E tudo por causa de uma estrutura ultramicroscópica, que nem celular é, capaz de causar um efeito mais devastador do que as sereias junto aos argonautas mais desavisados.

O medo do futuro ainda mais volátil, incerto, complexo e ambíguo acirrou em cada um a ansiedade, trouxe aquele “viver no amanhã” sem perceber o presente. “O que vou fazer se?” O mundo das possibilidades é o das idas e vindas, com curvas, bifurcações, subidas e descidas.

Aprendemos na marra que muitas relações como “se A, então B” caíram por terra. Ficamos nus em meio a uma tragédia. Grega? Não, humana e organizacional.

BANI, uma nova Afrodite

Demos conta de nossa fragilidade. Fomos contaminados pelo novo coronavírus, adoecemos, morremos, sobrevivemos. Nossas empresas também: muitas ainda resistem, outras cerraram as portas. Sonhos perdidos e futuros despedaçados nos dois casos.

O mundo precisava de uma nova tradução. Que se somasse ao VUCA e nos apoiasse para uma travessia mais segura possível.

E assim como Afrodite saiu das espumas de uma onda no mar, da onda da covid-19 surge o conceito BANI. Agora, temos um mundo brittle (de fragilidade), anxious (de ansiedade), nonlinear (não linear) e incomprehensive (incompreensível).

Para entender melhor, leia a seguir os detalhes de cada elemento do novo acrônimo:

Frágil

Se, no mundo VUCA, a volatilidade é predominante, no mundo BANI isso atingiu um grau tão extremo que basicamente tudo é muito frágil e sem solidez. Em outras palavras, a impermanência é marcante agora.

Pessoas sentem medo de perder o emprego do dia para a noite, empresas trabalham com planejamentos menos robustos e longos. Além disso, a maioria das pessoas parece compreender que tudo pode ruir a qualquer instante.

Ansiedade

Com certeza, nos últimos dois anos, a ansiedade foi um ponto de atenção maior ainda para muitas pessoas. Afinal, as incertezas do mundo VUCA se tornaram cada vez mais avassaladoras, gerando um cenário de medo, insegurança e impotência diante das mudanças.

Assim, a ansiedade pelo que “vai acontecer” se tornou latente e predominante para a maioria dos profissionais, fazendo com que muitos se sintam constantemente perdidos.

No mundo BANI, essa ansiedade acarreta medo de tomadas de decisão, barreiras a iniciativas novas e acaba impactando profundamente a busca por novas soluções.

Não linear

A complexidade do mundo VUCA se tornou a não linearidade, marcada especialmente pela desconexão entre causa e efeito. A crise de covid-19 e as mudanças climáticas são dois exemplos desse cenário.

Como aponta um artigo publicado nesta MIT Sloan Review Brasil é o mundo onde pequenas decisões podem trazer grandes resultados, enquanto um enorme esforço colocado numa variável importante pode gerar a total ausência de resposta.

Incompreensível

Por fim, a ideia de ambiguidade dá lugar a um momento de profunda incompreensão, que surge principalmente pelo excesso de informações. No mundo BANI, as informações correm com tanta frequência e rapidez que muitos simplesmente não sabem como agir.

A capacidade de analisar os fatos e compreender o que faz ou não sentido parece estar em crise atualmente. Assim, pessoas e profissionais estão constantemente sem resposta.

Em constante mudança

Se você não enxerga isso em seu trabalho ou em sua carreira, cuidado. Você pode ficar preso no tempo e espaço, petrificado, como quem se vê diante de Medusa. Espero estar apenas falando sobre gregos e não em grego.

O VUCA agora está BANIzado. Não significa que saiu de cena, mas que se complementa com o novo. Sempre o novo em nossas vidas, ainda incertas, que causam medo, expõe nossas fraquezas, nos deixa ansiosos, indo de um lado para outro, sem mais a certeza de que causa e consequência é um fato imutável.

Às vezes, temos a consequência, que pode ser uma causa ou sem causa conhecida. O mundo está mais incompreensível... E é nesse mundo que temos de seguir com nosso roteiro. Adaptando-o sempre, pois como disse Heráclito, filósofo grego: “a coisa mais constante é a mudança”.

BANI-se em tudo

Já pensou ter a carreira ou seu negócio banidono mercado? Pode soar esquisito, mas é bom (aliás, em espanhol esquisito é algo bom). Não tente explicar ou criar um sistema lógico para cada aspecto da palavra. Apenas busque o contexto. Veja o grande quadro que está na sua frente.

Se você tropeçar e cair, seja resiliente. Ou melhor, como gosto de chamar: seja “resilistente”. A capacidade de ser persistente, resistente, para ser resiliente. Após o baque, volte diferente a um ponto diferente. Dessa forma, sua resistência ao medo do risco e da mudança cresce e se fortalece.

O antifrágil cria a consciência da existência de fatores externos e inesperados (muitas vezes é difícil lembrar deles na hora de se planejar) e, diante desses fatores, encara a aleatoriedade com naturalidade e como fator benéfico, sempre buscando aperfeiçoamento. Enquanto todo mundo aposta em prevenção de riscos e antecipação de crises, você vai ser o único crescendo e se desenvolvendo diante dessas situações.

Sua carreira mais do que nunca é um conjunto de experiências, de conexões, de trocas e de muita colaboração. Assim é que se aprende mais, afinal, somos aprendizes.

Aprenda a entender o outro para melhor entender você mesmo. Ouvimos tanto que é preciso compreender a dor do outro. Por que só a dor? No fundo, quanto ouvimos atentamente o outro à nossa volta, seja ele cliente, amigo, colaborador ou aquela pessoa que vemos todos os dias no espelho?

Colocar-se no lugar do outro amplia o que entendemos como colaboração.

Como você se relaciona no dia a dia? Troca experiências ou as guarda a sete chaves num cofre, como seu segredo profissional? Você ouve genuinamente as pessoas ou somente escuta o que elas falam? Lembre-se sempre que um vírus derrubou grandes empresas – e nem eram concorrentes. Quanto mais você se abre, mais conhecimento entra. E mais valor é gerado.

Sua empresa atua assim? É transparente, a cultura é clara? Como são tomadas as decisões? Centralizadas ou as pessoas são empoderadas? Que variáveis são consideradas? Já pensou em caminhos que não fazem o menor sentido? Sua carreira é uma sucessão de caixinhas numeradas no organograma?

É olhando o contexto, ter “resilistência”, saber se conectar e colaborar, cuidar de seu autodesenvolvimento, equilíbrio emocional e controle da ansiedade com aquilo que melhor conecta você a você mesmo e ao outro. Além disso, ter agilidade em suas decisões e atitudes, ter empatia e atenção genuína no outro, saber se adaptar a caminhos improváveis e ser transparente — até para dizer que tudo é incompreensível — que não seremos banidos. Caso contrário, seremos, sim, banidos — mas de outra forma. Ou estou falando grego?

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Autoria

Colunista Adriano Lima

Adriano Lima

Global CHRO da Minerva Foods e Board Member das startups DataSprints e Leo Learning. Sócio Fundador da AL+ People & Performance Solutions, empresa que atuo como Coach Executivo de CEOs formado pela Columbia University, Palestrante e Escritor. Conselheiro de Empresas certificado pelo IBGC, Psicólogo com MBA pela Universidade de São Paulo e Vanderbilt University com formação em RH Estratégico Avançado pela Michigan University. Executivo sênior com passagens em posições de Liderança Global e América Latina de áreas de Pessoas, Cultura, Estratégia e Atendimento ao Cliente em empresas como Neon, Dasa, Itaú Unibanco e MasterCard. Professor de Gestão de Pessoas do Insper e Professor convidado do MBA da FIA/USP. Colunista das revistas HSM Management e da Época Negócios.

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