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Inovação

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O oba-oba das startups chegou ao fim?

Juros altos, guerra, pandemia, gestões falhas, baixa performance. As startups estão lidando com uma nova realidade – e vão precisar se adequar para sobreviver

Sandra Regina da Silva

04 de Julho

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Artigo O oba-oba das startups chegou ao fim?

Tem quem diga que o grande “auê” das startups, marcado pelo crescimento acelerado graças a aportes polpudos de capital de investidores, passou. Terá sido uma bolha? Ou apenas uma certa acomodação para se ajustar às realidades do mercado?

“Vivemos um momento de alta de juros, o que esfria a atividade econômica. Nesse cenário, os investidores ficam menos propensos a ativos de maior risco, buscando uma alocação mais criteriosa do dinheiro”, analisa Gustavo Gierun, CEO da plataforma de inovação Distrito.

Por conta disso, “as captações tendem a ser mais longas e rigorosas, o que pode impactar as operações financeiras das startups”, diz o executivo. O Distrito mapeia os dados de venture capital no Brasil, todo mês, atualizando número de investimentos, rodadas, M&As, principais transações e setores de destaque, entre outras análises.

Bruno Rondani, CEO e fundador da 100 Open Startups, plataforma de open innovation, não vê que fatores como alta de juros, guerra na Ucrânia, crise das commodities ou o preço do petróleo foram responsáveis por descortinar o atual cenário das startups. “A taxa de juros influencia quando se tem um mercado consolidado, tomando decisões nacionais”, afirma.

Entretanto, Rondani conta que o que surpreende um pouco é a fase de não matriculação – ou seja, várias startups não terem captado a próxima rodada de investimentos no momento esperado. Não que esteja faltando dinheiro, garante. “Os fundos que atuam no mercado brasileiro já estavam captados, num ciclo que dura de cinco a seis anos. Eles têm que investir nesse período, porque são pagos para isso.”

A questão pode não ser a falta de dinheiro, mas o excesso. Para ele, o atraso nas alocações de recursos é, provavelmente, por baixa performance das startups, o que está relacionado ao excesso de dinheiro num negócio que não estava maduro o suficiente. “Os fundos vão pôr mais, mas estão dando um puxão de orelha nas startups, querem que elas façam ajustes de gestão”, diz.

Reajuste de rota

Para uma startup atrair a atenção de investidores, portanto, seu empreendedor terá que mostrar capacidade em ser um bom gestor de recursos, substituindo o que vinha sendo até então valorizado, que era o crescimento acelerado a todo custo. “Modelos de negócio que preveem uma queima de caixa para escalar rapidamente serão preteridos em relação aos resilientes, que conseguem uma operação sustentável”, avalia Gierun.

É por isso que os empreendedores, sem a entrada de novos recursos como esperavam, agora estão tendo de reequilibrar as contas, com o objetivo de criar sustentabilidade financeira, em detrimento do crescimento. “As startups estão ajustando suas operações, prevendo um crescimento menos acelerado, mas o mais rentável possível”, diz.

O que se espera é que os empreendedores sejam hábeis em adaptar os modelos de negócio para o cenário em que se encontram: queimar menos caixa e aproveitar o máximo possível dos recursos de que já dispõem, segundo o CEO do Distrito. Por causa da situação atual, Gierun prevê ainda que o “smart money” também deva ganhar espaço nessa seara. Isso porque os fundos de venture capital serão cobrados pelo desempenho de seu portfólio.

“As gestoras mais presentes no dia a dia podem ajudar a organizar as startups, aumentando as chances de sobrevivência nesse cenário desafiador. Já investidores menos ativos podem passar por mais dificuldades, reduzindo o retorno desses aportes.”

Esse redirecionamento do foco é o que está levando, como um dos reflexos, à onda de demissões a que temos assistido. Isso até era esperado, na opinião de Gierun, quando há transição de ciclos como agora.

Rondani concorda. “Faz parte da lógica. A cada nova captação, uma startup contrata pessoas, mas quando não entra o investimento seguinte, tem que demitir”. Ele completa, ainda, que “são startups do mesmo ‘rebanho’, do mesmo lote. Com a travada das portas do venture capital, vieram 2 mil ou 3 mil demissões, o que assusta todo mundo”. Mas faz parte do jogo.

Cautela à vista

Fato é que as apostas de risco, características do venture capital, não estão vivendo uma crise. Um exemplo são 12 mil investidores brasileiros qualificados (que têm mais de R$ 1 milhão aplicados) que recentemente colocaram dinheiro no fundo de investimento em participações Headline XP (parceria entre a XP Asset e a Headline Venture). O fundo captou R$ 915 milhões, acima dos R$ 834 milhões inicialmente estimados.

Isso apesar da perda na valoração até das carteiras internacionais mais avançadas, o que ocorreu em todo o mercado de tecnologia, como Apple, Zoom e Magalu, entre tantas outras.

É no valuation das startups que está um grande desconforto. “O mercado de capitais é uma coisa linda do capitalismo, que é distribuir a riqueza pelo mercado, o que dá liquidez para a jornada investidora. Mas agora tem quem esteja jogando o valuation para 20 anos na frente, prejudicando o mercado de capitais. Muitas startups entraram com esse, digamos, problema”, avalia Rondani.

Ele cita, como exemplo, o caso do Nubank, cujo IPO foi postergado enquanto o banco buscava investidores privados. Quando a fintech finalmente estreou na Bolsa de Nova York, em dezembro de 2021, quem entrou “quebrou a cara”, nas palavras de Rondani. “O Nubank deixou para o mercado de capitais só o osso. Agora, vem dizer que daqui a dez anos se recupera o dinheiro, só que isso não foi dito no IPO”. Seis meses depois, as ações do banco caíram mais de 50%.

Isso, segundo Rondani, é um fenômeno que tem acontecido com certa frequência, o que leva à perda de confiança no mercado. “Eu sustento que vai cair depois dos IPOs de tech. Então, fuja deles.”

A realidade do mercado, porém, não vai impedir o surgimento de novas startups. Mas pode ser mais difícil escalar o negócio daqui para frente, na opinião de Gierun.

Uma alternativa é partir para spin-offs (startup que nasce dentro de uma empresa tradicional, mas como um negócio secundário). Para o CEO do Distrito, “são uma maneira inteligente de blindar novos projetos das dificuldades do mundo corporativo. Com isso, é possível criar budget e time dedicados com um nível de ruído e distrações menor, aumentando a chance de sucesso”.

Já Rondani, que não vê o venture capital como uma mola propulsora sustentável, acredita em promover startups num ecossistema envolvendo empresas, executivos, cientistas e governo de forma colaborativa, inserindo o empreendedorismo de novas ideias num modelo em rede. Isso alavancaria negócios que impactam desafios reais vividos pela sociedade e pelo mercado.

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Autoria

Sandra Regina da Silva

Sandra Regina da Silva é colaboradora de HSM Management.

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