fb-embed

Inteligência artificial e gestão

4 min de leitura

IA generativa como elemento de justiça social

O Brasil deve enfrentar alguns desafios para evitar que a inteligência artificial agrave a desigualdade social no País. A democratização de acesso à internet e às novas tecnologias seria uma das soluções para que essa projeção não se torne realidade

Luciana Vidigal

23 de Outubro

Compartilhar:
Artigo IA generativa como elemento de justiça social

A paixão do brasileiro por tecnologia já foi amplamente documentada: adoramos uma novidade digital. Com a inteligência artificial (IA) generativa não é diferente. Um estudo da agência Semrush, com dados de janeiro de 2023, coloca o Brasil entre os cinco países que mais acessam o ChatGPT. Dos 863 milhões de acessos à ferramenta (até a data da pesquisa), 4,3% vieram daqui.

Isso é bom? Provavelmente sim. Mas... tem sempre um mas.

A integração da IA generativa ao cotidiano é um movimento sem volta, como o Pix e os vídeos de dancinhas. Em breve, todo tipo de trabalho será realizado com o auxílio (ou totalmente) de robôs, já que os assistentes digitais inteligentes farão parte da paisagem profissional, educacional, de lazer – e do que mais sua imaginação alcançar.

Especialistas chamam essa tendência de os humanos se misturarem com máquinas de simbiose tecnológica. Nesse sentido, estamos falando não apenas de uma revolução tecnológica, mas de uma mudança profunda no estilo de vida. E, apesar de toda a afinidade e curiosidade do brasileiro sobre ferramentas digitais, vamos combinar que nem todo mundo está preparado para uma mudança dessa proporção. Se é que alguém está.

A consequência mais imediata e visível atinge o mercado de trabalho. O Fórum Econômico Mundial tem um estudo sobre isso, no qual estima que 85 milhões de empregos vão desaparecer no mundo inteiro nos próximos dois anos, mas 97 milhões de novos postos serão gerados.

Quais empregos serão esses ainda não se sabe bem – muitas dessas funções ainda nem existem. A única certeza é que quem não adquirir novas habilidades e capacitações profissionais terá muita dificuldade não só no trabalho, mas em vários aspectos do cotidiano.

Imagine, por exemplo, perguntar a um ChatGPT da vida “estou com dor no peito, o que pode ser?” – uma descrição de menos de dez palavras. Agora pense que tipo de resposta a máquina devolveria se a descrição fosse mais detalhada, por exemplo, citando temperatura do corpo, batimentos cardíacos, tontura, náusea etc. Dá para perceber que, dependendo do nível de conhecimento da pessoa, ela vai usar a ferramenta de forma mais eficiente.

Esse tipo de reflexão me faz pensar que o risco de a inteligência artificial aumentar a desigualdade social é bem real. Na educação, por exemplo, a IA generativa vai nos ajudar a desenvolver o pensamento crítico e a criatividade, a aprender a reconhecer notícias falsas e dados incorretos, a não nos contentar com respostas genéricas e superficiais.

Mas isso vale só para quem tiver acesso à tecnologia. E, no Brasil, uma em cada cinco escolas não tem sequer acesso à internet. Na pandemia, nove em cada dez professores da rede pública apontaram a falta de dispositivos e acesso à internet como a principal dificuldade dos alunos para acompanhar as aulas online.

Temos então dois desafios a vencer se quisermos realmente evitar que a revolução tecnológica em curso aprofunde (em vez de reduzir) a desigualdade social: primeiro, a falta de conectividade na rede pública de ensino e nas casas das populações mais vulneráveis. Segundo, a oferta de informação, treinamento e capacitação para que as pessoas consigam navegar nesse novo mundo povoado por máquinas inteligentes. Isso vale não só para os menos escolarizados, mas também para os mais velhos e os que serão mais atingidos pela automação.

É bem verdade que já existe uma lista de “prompts” (os comandos que inserimos em busca de respostas) que geram os melhores resultados, o que facilita o uso da tecnologia. O robô transforma a frase, ou pedido, em tokens (elementos que representam as palavras) e compara com os bilhões de parâmetros que têm disponíveis em sua memória. Com isso, ele deduz o problema e constrói uma resposta. Mas essa resposta será melhor quanto melhor for a pergunta. Formação e pensamento crítico, lembra?

Se pararmos para pensar, desde sempre fomos pagos para trabalhar. Porém, em breve vamos receber para estudar, porque o novo mercado de trabalho vai precisar de atualizações frequentes, treinamento e capacitação. Quem quiser acompanhar o que acontece na cultura, na economia, no planeta terá que seguir esse caminho. Tudo vai se transformar e se redefinir, por isso, os aprendizados constantes e permanentes serão vitais.

O nível de educação (e, por extensão, o contexto econômico e social) influencia fortemente o grau de aproveitamento que se pode obter da IA generativa. Para evitar que a defasagem econômica, social e educacional torne a tecnologia um fator a mais de desigualdade, precisamos investir fortemente em educação, da base ao topo. Essa pode ser nossa grande chance de voltarmos aos trilhos do desenvolvimento, só que, desta vez, com justiça social.

Compartilhar:

Autoria

Luciana Vidigal

Luciana Vidigal é consultora de comunicação e novos negócios da CoWork Comunicação. Publicitária, entusiasta da transformação digital e ansiosa pela chegada de novas tecnologias.

Artigos relacionados

Imagem de capa A inevitável transição do people analytics para o people intelligence

Gestão de pessoas

11 Abril | 2024

A inevitável transição do people analytics para o people intelligence

O cenário é de rápidas transformações e uma coisa é certa: a IA chegou para ficar e as companhias precisam absorvê-la e usá-la a seu favor. Por isso, é hora de estar preparado para usar isso com inteligência

Ivan Cruz

5 min de leitura

Imagem de capa A área de Gente e Gestão está pronta para lidar com a desafiadora Inteligência Artificial (IA)?

Empreendedorismo

23 Fevereiro | 2024

A área de Gente e Gestão está pronta para lidar com a desafiadora Inteligência Artificial (IA)?

Um texto sobre IA, feito por mãos humanas e com questionamentos existenciais: será que estamos preparados para este contraponto?

Ivan Cruz

8 min de leitura

Imagem de capa As oportunidades de IA para o varejo brasileiro

Inteligência artificial e gestão

28 Novembro | 2023

As oportunidades de IA para o varejo brasileiro

A inteligência artificial terá o seu futuro garantido no Brasil se os varejistas a colocarem como prioridade e estratégia, para navegar e inovar no digital. A IA generativa pode destravar um novo nível de produtividade na força de trabalho do setor e de satisfação e fidelidade entre os clientes

Marcelo Toledo

4 min de leitura

Imagem de capa IA generativa como elemento de justiça social

Inteligência artificial e gestão

23 Outubro | 2023

IA generativa como elemento de justiça social

O Brasil deve enfrentar alguns desafios para evitar que a inteligência artificial agrave a desigualdade social no País. A democratização de acesso à internet e às novas tecnologias seria uma das soluções para que essa projeção não se torne realidade

Luciana Vidigal

4 min de leitura

Imagem de capa Como a IA pode potencializar sua marca pessoal sem perder autenticidade?

Inteligência artificial e gestão

19 Outubro | 2023

Como a IA pode potencializar sua marca pessoal sem perder autenticidade?

Em tempos de algoritmos, o desafio é manter autenticidade para gerar confiança e conexão. A tecnologia deve ser uma aliada e ferramenta poderosa que pode enriquecer a vida profissional e pessoal, mas não deve ditá-las

Giuliana Tranquilini

5 min de leitura