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Expo 2020 Dubai mostra o espírito do tempo na prática

Um olhar com distanciamento sobre a Expo 2020 Dubai demonstra que as projeções de um futuro próspero são possíveis. Inclusive no presente

Andrea Dietrich, Lilian Cruz e Monica Magalhães

06 de Abril

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Artigo Expo 2020 Dubai mostra o espírito do tempo na prática

Durante a Expo Dubai 2020 (que, vale lembrar, foi adiada para outubro de 2021 por conta da pandemia), a Al Wasl Plaza se tornou um portal para um outro tempo. Um tempo que, para muitos, é uma utopia de futuro desejável. Os quatro quilômetros quadrados da exposição reuniram um mix de tecnologia, cultura e sustentabilidade que são marca do lifestyle do século 21. Iniciativas de todos os cantos do mundo congregaram vida urbana segura, sociedade diversa, tecnologia massiva e abundante e, ao mesmo tempo, ordinária e imperceptível, orientadas por um modelo de gestão ambientalmente sustentável e de lideranças conscientes.

Ao longo dos últimos meses, a programação extensiva (e intensiva) da Expo possibilitou uma leitura sutil, porém muito presente, de cenários, principalmente sobre a inovação tecnológica como base das diversas tendências (e de mais esperança) para vencer os desafios climáticos. Em nossa visita a Dubai, no início de 2022, verificamos como o mundo está reunindo todos esses elementos em torno de quatro tendências em sintonia com o espírito do nosso tempo.

Tendência 1: Equilíbrio entre negócios e planeta

Na Expo, o visitante fica consciente, a todo instante, sobre como tudo está conectado. A pergunta: "Porque você se importaria", no pavilhão da sustentabilidade, questiona o papel das marcas no estímulo ao consumo que impactam drasticamente os ecossistemas. A experiência apresenta dados de que metade das tartarugas marinhas e um quarto dos peixes que consumimos têm plástico em seu organismo. O pavilhão da Alemanha trouxe um olhar para a gestão de recursos com inúmeras ideias criativas para fazer diferente e no pavilhão da Holanda, a tecnologia ajuda a cultivar alimentos e até fazer chover no deserto. Dubai reúne uma diversidade de soluções sustentáveis surgidas no ecossistema de inovação que tanto ajudam tanto no combate às causas quanto às consequências da crise climática.

Por que isso é relevante? A agenda ESG e o capitalismo de stakeholders estão cada vez mais fortes, o que significa que impactar e gerar valor a todas as partes interessadas é muito mais do que um modismo. De acordo com a pesquisa Perfil do Investidor em Startups 2021, conduzida pela CapTable, o impacto social da iniciativa é o quarto item avaliado como fator de decisão para 41% dos investidores, ficando atrás somente da avaliação de critérios como: eficácia do modelo de negócio, escalabilidade e eficiência do time de empreendedores.

No Brasil, as startups do setor ESG também começam a atrair mais investimentos: já receberam juntas um total de US$ 991 milhões ao longo da última década, sendo aproximadamente 90% de todo volume investido nos últimos três anos, segundo dados do hub de inovação Distrito. As startups que atuam no segmento de meio ambiente e categoria social são a grande maioria, representando 70% das startups mapeadas no estudo. A inovação pode ser sim um motor para os objetivos e práticas de ESG. E as empresas devem seguir se transformando e se conectando cada vez mais a este ecossistema emergente para atingir esses objetivos.

Viu como é possível? Para a magia acontecer, a tolerância, a coexistência, a esperança, a coragem e o otimismo devem guiar líderes e organizações para que possam verdadeiramente apreciar o passado, compreender o presente e idealizar o futuro, juntos.

Tendência 2: Lideranças conscientes

A ampliação da consciência dos líderes das organizações é o primeiro passo para transformar sonhos e aspirações em realidade. E também os líderes das nações representadas nos pavilhões dão o tom para a visão de futuro do mundo, numa trajetória intensa e consistente para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela ONU na Agenda 2030. Na Expo, presenciamos a semana de Objetivos Globais – que aconteceu pela primeira vez fora da sede das Nações Unidas, em Nova York – reforçando a importância do evento em demonstrar a grande ambição de se buscar soluções e iniciativas inovadoras para desafios como desigualdade social, mudanças climáticas e desigualdade de gênero.

E não há escassez de desafios.

Nas últimas três décadas, apesar da pobreza global ter se reduzido em 75%, as mulheres ainda têm maior probabilidade de viver em pobreza extrema do que homens. Só em 2021 foram registradas 47 milhões de mulheres em situação de extrema pobreza (fonte: ONU).

A Expo reforçou de forma prática e inspiradora o quanto as marcas podem ser lideranças na redução desse desequilíbrio, como ocorreu com a Cartier, por exemplo. Ao patrocinar o Pavilhão das Mulheres do evento, a emblemática joalheria buscou estabelecer um padrão necessário para as empresas repensarem sua abordagem de defesa de gênero. Com isso, trouxe à tona o quanto o setor privado pode colaborar na transformação da realidade, se houver uma atuação conjunta com sociedade civil e lideranças políticas. E também atuações individuais na gestão das empresas, principalmente estratégicas. Afinal, estudos já comprovaram que mulheres em conselhos de administração levam as organizações a terem 28% mais chances de prosperar.

Além da equidade de gênero, as novas tecnologias também são um importante habilitador para se fazer mais com menos. Mas quais são, de fato, os problemas que elas estão resolvendo hoje? Seriam elas as soluções para salvar o mundo, ou nós precisamos nos transformar para sobrevivermos neste mundo?

Este caminho exige um despertar de líderes conscientes, sustentáveis. O futurista e autor Stefan Hyttfors declarou:

“Temos que compreender e pensar sobre o fato puro e simples de que estamos entrando em uma era onde nossa experiência e conhecimento terão proporções mínimas quando comparados à inteligência total disponível.”

O início deste despertar é o reconhecimento pela liderança de que é necessário valorizar cada vez mais o aprendizado contínuo e a nutrição de uma cultura na qual as pessoas sejam ousadas o suficiente para desafiar a experiência.

Por que isso é importante? Mais do que nunca, mudar o jogo e fazer o que até então parecia impossível passa pelo papel da liderança e pela importância de criar conexões. A conexão de mentes diversas é uma premissa em um mundo no qual as fronteiras do físico e digital se fundem, e no qual a tecnologia e os dados habilitam a mente para pensar um futuro que não apenas possa gerar grandes oportunidades, mas também que seja mais sustentável e mais humano.

Mas, como os líderes dos negócios podem destravar a potência da mente humana, em si mesmos e em suas equipes? A consolidação de mentes diversas em seu máximo potencial cria um salto de oportunidade, onde a cooperação está acima de qualquer complexidade.

Quanto mais conexões, mais ideias. Quanto mais ideias, mais tecnologias. O futuro coletivo começa a ser formado. Assim, as organizações que fomentam a cooperação ao invés da competição são aquelas que irão capturar o maior número de oportunidades

Tendência 3: Visão de futuro para inovação e transformação digital

A Expo 2020 nos mostrou que as inovações necessárias para que as cidades sejam mais inteligentes e sustentáveis já existem. A grande maioria, inclusive, deriva da transformação digital da “Agricultura 5.0” combinada com as inovações da “Indústria 4.0”.

Analisando isoladamente as soluções, por um momento podemos pensar que não há nada de novo, mas tudo isso junto na administração centralizada dentro de uma cidade é impactante e inovador. Vimos que é possível ter estações meteorológicas inteligentes que, inclusive, já são utilizadas há anos no campo, mas é algo novo usar a mesma técnica para determinar quando regar os jardins da cidade. A energia fotovoltaica já é explorada há algumas décadas; porém a gestão balanceada do consumo entre mais de 130 prédios é algo inovador. E se é comum para quem frequenta as feiras e eventos de inovação ver alguns robôs circulando, é impactante ter 150 deles envolvidos no entretenimento das crianças, na recepção dos visitantes e até mesmo gerenciando a segurança das pessoas (no caso, uma bronca para colocar a máscara em um tempo de controle sanitário bastante rígido). Sim, isso é algo novo.

Imagine uma cidade onde é possível mensurar a emissão de carbono de cada prédio. Sim, é possível, sem falar nas centenas de soluções IoT espalhadas pela cidade – lixeiras inteligentes que avisam quando estão cheias, câmeras que detectam lixo no chão, sensores de movimento que disparam alertas de segurança, dispositivos sonoros que medem os decibéis e notificam os responsáveis caso o som esteja fora da margem permitida. Tudo isso junto é algo inovador! Ao se colocar como um experimento de cidade do futuro, a Expo reforça a confiança de que é possível transformar diversas questões dentro do espectro ESG a partir dos avanços da transformação digital.

Por que isso é importante? Em 2100, 85% da população viverá em áreas urbanas e, portanto, vamos precisar ressignificar a cidade como um motor de inovação e sustentabilidade. Metrópoles sempre foram o ponto de desenvolvimento humano e nesse novo momento é preciso trazer soluções mais inteligentes e eficientes para a mobilidade, a produção de alimentos e o abastecimento limpo de energia. A questão energética é premente, inclusive pela escassez das fontes fósseis, somadas à questão climática. Segundo pesquisa apresentada pela BP (British Petroleum), uma das maiores empresas mundiais de extração de petróleo, que avaliou o consumo versus as reservas globais em 2019, restam apenas 47 anos de exploração de combustíveis fósseis. Tempo que talvez não seja suficiente para todas as mudanças que precisam ser feitas.

Claro, se todas as cidades pudessem ser construídas do zero seria mais simples. Mas a realidade é outra: a grande maioria precisa lidar com um passado tecnológico grande, pesado e custoso, percorrendo a dupla jornada de sempre buscar acompanhar a oferta existente de facilidades ao cidadão. A criatividade, o desapego e a ousadia passam a ser chaves para guiar um novo cenário possível.

Tendência 4: Tecnologias a serviço de experiências imersivas

E imagine nessa cidade do futuro como as interações seriam? Entre marcas, entre negócios, entre pessoas? Entre diversos momentos "wow", que não somente impactam pela beleza, pela música, pela projeção, pudemos sentir a real reflexão sobre empatia e colaboração.

É possível, por exemplo, contar com um device para que as pessoas rastreiem, entendam e assumam a responsabilidade de sua pegada ambiental por meio de ferramentas digitais. Essa foi parte da experiência imersiva trazida pela Mastercard, entre tantas experiências multissensoriais conectadas ao “fazer o bem”, demonstrando através da tecnologia como podemos nos conectar às coisas mais importantes.

Outra que explorou as possibilidades da realidade virtual foi – novamente – a Cartier. Sua experiência permitiu que os participantes sentissem na pele os desafios da equidade de gênero na sociedade, escancarando com dados e fatos as diferenças que ainda sofremos.

Por que isso é importante? É esse tipo de emoção que precisamos promover como executivos, como empreendedores, como marcas. Afinal, se tem uma coisa que a pandemia transformou de vez foi a nossa percepção de valor entre “coisas” versus “experiências memoráveis”.

Esse desejo é respaldado por pesquisa com quase 2 mil profissionais de negócios elaborada pela SuperOffice. Segundo o estudo, a experiência do cliente é uma das principais prioridades para os próximos anos para 46% dos entrevistados. E 86% dos compradores pagariam mais para ter uma boa experiência.

Estamos na economia da experiência.

Queremos experiências que nos tornem pessoas melhores, mais fortes, mais felizes, mais conscientes… E passa a ser papel das marcas nesse novo cenário provocar a mudança, impulsionar o ecossistema com discursos menos egocentrados e mais verdadeiros com as necessidades da nossa sociedade.

A compra em vários dispositivos por meio de uma ampla variedade de canais, as novas gerações totalmente imersas nos seus mundos digitais, com o metaverso e redes sociais, tornou difícil para as empresas manter a consistência e a relevância. Sem dúvida, o maior facilitador da experiência é a tecnologia, que habilita a personalização, a inovação e a conexão, mas o que estamos acompanhando é que somente investir em tecnologia não garante uma boa experiência. O fator humano é o que muitas vezes garante a diferenciação.

Então, se basta ter as melhores ferramentas tecnológicas, a empatia, a criatividade, a gestão de dados, a habilidade de fazer a gestão integrada entre todos os canais, entram também como fatores-chaves para essa tal “cultura da experiência”. Isso impacta em como pensamos e fazemos o produto, em como investimos nos dados e na jornada do cliente, em como valorizamos nossa cultura e nossa gente como parte fundamental desse processo.

Falando em empatia, a Expo nos fez um convite para a cooperação, para criarmos nosso futuro comum. Se estivermos a “seis graus de separação” de qualquer pessoa, com o avanço da tecnologia e das redes sociais, estaremos definitivamente capazes de estarmos todos conectados.

E o que faremos com essa conexão que está em nossas mãos? Convidamos você a refletir sobre os significados da frase abaixo, que fez parte do pavilhão da Rússia – e que, paradoxalmente ao momento atual de conflito, destruição e luta por poder, nos fala sobre a força da colaboração.

O cérebro nos ensina uma lição importante: bilhões de células nervosas, por mais peculiares que sejam, se unem para construir a mente, que é sustentável, móvel e nos apresenta infinitas oportunidades. Se a natureza pode fazer isso, nós também podemos. Usando a cooperação humana em prol do nosso futuro comum.

Leia mais: O objetivo de escalar globalmente

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Autoria

Andrea Dietrich, Lilian Cruz e Monica Magalhães

Andrea Dietrich é consultora em transformação digital, marketing e cultura digital & branding. Fundadora da consultoria Didietrich e co-fundadora da Ambidestra. Lilian Cruz é consultora e mentora em inovação e especialista em estratégia de negócios, marketing e transformação digital. Fundadora da Zero Gravity Thinking e co-fundadora da Ambidestra. Monica Magalhães é empreendedora, palestrante e educadora. É especialista em Inovação, Transformação Digital e facilitadora de Inovação aberta. Chefe de conteúdo no Instagram @shelovesfuture.

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