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A experiência de uma grande empresa com IA

Tassilo Festetics, vice-presidente de soluções globais da AB InBev, indica os principais desafios da transição vivenciada pela maior cervejaria do mundo

19 de Abril

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Artigo A experiência de uma grande empresa com IA

À medida que se torna mais usual, a inteligência artificial (IA) se integra às operações cotidianas das empresas tradicionais. É o que vem acontecendo, por exemplo, na Anheuser-Busch InBev, a maior cervejaria do mundo, e uma das maiores companhias de bens não duráveis de consumo rápido do planeta [controlada pelo fundo de investimentos 3G Capital, de brasileiros].  

Com uma atividade cervejeira que remonta a 1366 graças à empresa belga Interbrew, a AB InBev está descobrindo que a IA pode ajudar a organização em diversos campos, como precificação, gestão da cadeia de fornecimento e serviços administrativos. 

Uma transição como essa, no entanto, não costuma ser fácil. Como empresa de atuação global, a AB InBev tem dados dispersos – e dados são a matéria-prima da inteligência artificial. Além disso, até recentemente, poucos funcionários eram suficientemente capacitados para lidar com IA. 

O quadro começa a mudar, no entanto. Como vice-presidente de soluções globais, Tassilo Festetics vem supervisionando há dois anos as operações de tecnologia, análise de dados e back-office. Sua equipe está estruturando a inteligência artificial ao longo de toda a companhia – e tem feito isso muito rapidamente. 

A entrevista a seguir é resultado de uma conversa de Festetics com Philipp Gerbert, sócio sênior do Boston Consulting Group (BCG) e membro do BCG Henderson Institute.

Quais têm sido as principais áreas de aplicação da IA nas empresas?

Antes de tudo, é importante destacar que a inteligência artificial já está em todo lugar nas grandes empresas. A maioria delas vai conviver com IA em algum lugar, sabendo ou não.

Para começar, acho que precificação é um bom lugar. A atividade traz retornos significativos, que são diretamente mensuráveis. Além disso, há muitos dados disponíveis. 

Também há o back-office. A área administrativa sempre vem por último na maioria das empresas, porque não é a mais atraente, porém é preciso ter em mente que ela pode ser substancialmente transformada pelo machine learning. 

Como fazer com que a mudança aconteça? Como conseguir que a alta direção “compre” a ideia?

A resposta é bem fácil. Você mostra a eles o dinheiro. No momento em que surge o ganho financeiro, a mudança se torna muito mais fácil. Não é brincadeira: esse é o melhor caminho. Focar em iniciativas que tenham os mais altos retornos sem demora pavimenta a rota para as demais atividades. 

Como envolver a equipe?

Essa provavelmente é a parte mais decisiva – e também a mais complicada. Por um lado, é preciso contratar pessoas novas. Não somos uma empresa digital; somos uma companhia que está sendo digitalizada. Então, temos de trazer pessoas que entendam de inteligência artificial. 

Por outro lado, estamos treinando as pessoas que fazem parte da equipe. Por exemplo, levei todo o meu time, no ano passado, para [a University of California em] Berkeley, e passamos uma semana nos debruçando sobre machine learning e IA. 

Em nossas pesquisas, observamos que desenvolver aplicações específicas para IA é a parte fácil da equação. O mais difícil é escalar para toda a empresa. Para você, quais são os desafios centrais?

O primeiro desafio é a disponibilidade de dados e o acesso a eles. Nossa empresa vem trilhando um longo caminho de fusões e aquisições, e isso faz com que nosso panorama de dados se encontre em extrema fragmentação. E o segundo desafio é o que você mencionou: fazer com que os recursos e as capacidades da companhia estejam prontos para funcionar com algoritmos. 

Quais as ações mais importantes até agora?

Nós envolvemos nossa operação da Índia desde o início. Também iniciamos logo a contratação dos talentos certos e o desenvolvimento das capacidades que não tínhamos. O envolvimento com as universidades também foi importante; trabalhamos muito com o MIT [Massachusetts Institute of Technology], obviamente, mas também com universidades da Índia. É preciso ser capaz de construir uma marca forte nessa área de IA, de modo que essa marca consiga recrutar os recursos certos de que precisa. 

Em retrospectiva, você teria feito algo diferente?

Sim, teria investido bem mais cedo nas capacidades necessárias. Também teria destinado bem mais tempo à questão dos dados, fazendo isso desde o início. Se você for observar a maioria dos projetos que temos em andamento, verá que os especialistas em dados passam 60% a 70% do tempo lidando com a aquisição de informação, o que é uma enorme perda de tempo. O problema é que os dados se encontram muito fragmentados para nós. 

Quais foram suas maiores surpresas?

Muitas empresas organizam seu back-office em grandes prédios em que milhares de pessoas interagem e realizam transações. Minha surpresa foi perceber que, fazendo uma projeção, de cinco ou dez anos mais para frente, esses prédios não existirão mais; serão substituídos por um punhado de programadores lidando com algoritmos. 

Qual a percepção dos funcionários da AB Inbev sobre o programa de inteligência artificial? E como vocês lidam com as eventuais preocupações deles?

Essa percepção é diferente nos diversos níveis hierárquicos. E, é claro, há preocupações. 

Pense, por exemplo, na questão que eu mencionei anteriormente, sobre as atividades de back-office. Eu realmente acredito que essa área vai passar por uma total revolução. Mas é muito difícil se colocar diante da equipe e dizer: “Uau. Acho que a área administrativa vai desaparecer”.

Antes de tudo, eu não creio que os funcionários perderão seus empregos. Essas posições passarão por uma transformação. É preciso um processo de educação para que as pessoas não fiquem com medo, para que se conscientizem de que seus empregos estão evoluindo. Trata-se de desmistificar a transformação em curso. 

Há algo nesse front que a AB InBev gostaria de aprender com outras empresas?

Uma coisa que acho que nós não pensamos é como definir uma trajetória de carreira para os profissionais que estão trabalhando como campo da inteligência artificial. Estamos nos perguntando: “Como podemos dar uma perspectiva de carreira para essas pessoas? Como podemos garantir que elas não nos deixem assim que esse projeto de dois anos termine? Como fazer com que enxerguem oportunidades de crescimento em nossa companhia, sem a necessidade de mudar de trabalho constantemente?”

Você pode nos dar um exemplo de como a IA contribuiu para a cadeia de fornecimento da InBev?

Gerenciamos 400 cervejarias em todo o mundo. São fábricas repletas de máquinas que, como é natural, acabam quebrando. Quando isso acontece sem aviso prévio, interrompe-se toda a cadeia de produção e é preciso trocar o equipamento.  

Encontramos uma empresa que possui uma ferramenta de IA que “ouve” as máquinas e aprende a característica básica do barulho do motor. Alguns motores chegam a fazer cinco diferentes ruídos antes de quebrar. Isso foi uma ajuda enorme.

© BCG

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