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Liderança, times e cultura

8 min de leitura

Trabalho híbrido

O modelo de trabalho flexível vem exaltando os ânimos, com defensores radicais de lado a lado. Geralmente lideranças querem a volta do trabalho presencial e os demais funcionários insistem em poder trabalhar remotamente com alguma frequência. Segundo depoimentos colhidos por HSM Management, no entanto, a decisão gerencial de adotar o trabalho híbrido é, sim, um booster de desempenho – desde que o modelo seja bem estruturado. Este artigo, baseado em diversas pesquisas, mostra que isso depende fortemente do papel das mídias – elas influem na formação de times, na produtividade e no bem-estar.

Colunista Anna Queiróz

Anna Queiróz

29 de Dezembro

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Artigo Trabalho híbrido

Aqui em Stanford, EUA, há um levantamento sobre modelo de trabalho em andamento desde maio de 2020 com 35 mil americanos. Até agora, vem mostrando que 32% deles não querem voltar nunca mais para o escritório. Segundo pesquisa global publicada na MIT Technology Review, as empresas estão prestando atenção: 92% delas dizem que a prioridade nos próximos anos deve ser entender como os funcionários se sentem sobre o trabalho, focando experiências positivas.

Quantas vezes a amizade no ambiente de trabalho nos ajudou a resolver problemas e encarar o dia a dia com mais leveza? Quantas vezes aquele cafezinho após uma reunião difícil nos deu resiliência?


Em termos de execução de trabalho, já não há mais diferença entre o escritório e o home office ou um hotel; já em termos de socialização, a história é outra


Com a evolução tecnológica e o avanço no mercado de serviços, muito frequentemente o resultado do trabalho passou a ser mais abstrato, e sua execução agora pode ser feita a partir de dispositivos portáteis acessíveis aos funcionários em qualquer lugar do planeta.

Pode-se dizer que, em termos de execução do trabalho, não há mais diferença entre fazê-lo no escritório da empresa, na sala de casa ou em um quarto de hotel. Mas, em termos de socialização, a história é outra. Embora as formas de comunicação mediada por computadores e dispositivos portáteis tenham crescido e melhorado exponencialmente nos últimos anos, ainda há diferenças importantes entre os encontros pessoais e os digitais.

Pode-se dizer que há um padrão:

  • As mídias simples (como os e-mails) são convenientes para trocas rápidas de informação e conexões superficiais com as pessoas, onde quer que estejam. Nas empresas, essa forma tem auxiliado bastante no acompanhamento de projetos, esclarecimento de dúvidas e tomada rápida de decisões simples entre o time e a liderança.

  • A comunicação por vídeo assíncrono, como o que vemos publicamente em plataformas de mídia como YouTube e TikTok, têm mais riqueza na comunicação, sendo possível identificar o alinhamento entre expressões faciais e conteúdo da fala e tirar conclusões sobre o engajamento emocional da pessoa que transmite a mensagem pelo vídeo. Porém, sendo uma comunicação de apenas uma via, sem interação, o formato é ótimo como meio informativo, por exemplo, numa apresentação de novos produtos entre áreas diferentes da empresa, mas desaconselhável para a tomada de decisões complexas e alinhamento de objetivos e tarefas.

  • As ferramentas de videoconferência são um formato de mídia rico que permite interação instantânea e visualização de aspectos não verbais do comportamento, importantes para a compreensão integral da mensagem, como expressões faciais, gestos e entonação da voz. E foram um bote salva-vidas durante os períodos de reclusão impostos pela pandemia, permitindo discussões remotas próximas do que seriam as discussões presenciais. Mas, ainda assim, algo estava diferente, não estava? E ainda está, o que cria o ruído em relação ao modelo.


- E-mails: trocas rápidas de informações superficiais. Ideal para tomada de decisões simples do dia a dia.
- Vídeos: informativo, rico em detalhes. Ideal para compartilhar informações.
- VIDEOCONFERÊNCIA: comunicação em tempo real, rico em detalhes, ideal para suportar tomadas de decisão mais complexas e alinhamento do time.

Com isso em mente, conduzimos diversas pesquisas em Stanford e no Brasil para entender os aspectos psicológicos e sociais das videoconferências.

Reuniões online cansam mais

o todo, mais de 15 mil pessoas responderam a questionários contando como se sentiam durante e após reuniões em videoconferência, bem como comparando suas experiências online e presenciais.

Comparando estudantes do ensino superior com trabalhadores no Brasil, os primeiros reportaram mais cansaço após videoconferências principalmente em função das longas aulas. Isso nos mostra que o tempo dos encontros online precisa ser repensado com cautela; devem ser mais breves e menos frequentes, e ter mais pausas do que se fossem encontros presenciais.

E por que nos cansamos mais quando estamos em reuniões online do que em presenciais? Numa pesquisa com quase 10 mil pessoas nos EUA, descobri que as pessoas se cansam por experimentarem o que chamamos de “sobrecarga não verbal” – ou seja, uma necessidade adicional de processamento da informação não verbal no ambiente digital (gestos, expressões faciais, entonação da voz), por conta das características desse ambiente digital.

Por exemplo, o fato de podermos ver nossa própria imagem na tela durante as reuniões online faz com que estejamos o tempo todo verificando a adequação dos nossos movimentos e imagem, exigindo mais atenção e cansando mais. Ver a própria imagem na tela contribui para o cansaço, sobretudo entre mulheres, reflexo da pressão social que recai sobre elas em relação à própria imagem. Outros elementos das reuniões online que contribuem para o cansaço são o fato de ficarmos sentados por muitas horas em frente ao computador e termos a sensação de que muitas pessoas estão olhando para nós ao mesmo tempo – na visualização em galeria.

Em outra pesquisa com quase 4 mil pessoas nos EUA, descobrimos que nos sentimos mais conectados uns aos outros quando fazemos por volta de três ou quatro reuniões curtas por dia, em grupos pequenos. À medida que as reuniões se tornam mais longas ou os grupos maiores, as pessoas reportaram sentir mais cansaço e essa conexão com os outros diminui.

Os dados também mostraram que quanto mais frequentes e cansativas as reuniões, maiores os impactos negativos no bem-estar das pessoas, principalmente ao que se refere à satisfação com o trabalho.

A EXPERIÊNCIA DE TRABALHO no modelo híbrido pode melhorar muito diante desses achados. Um líder precisa saber lançar mão dos recursos tecnológicos para formar times de alta performance. Os encontros precisam ter um propósito muito bem pensado, e seu formato – presencial ou digital – deve seguir esse propósito.

Reuniões de alinhamento e tomadas de decisão de percurso podem ser realizadas digitalmente, dando flexibilidade ao time e melhorando a experiência de trabalho em geral. Já decisões importantes e momentos de confraternização têm de ser sempre presenciais, pois presença plena e conversas informais são importantes nesses momentos.

É preciso, acima de tudo, considerar que os indivíduos são diferentes entre si, como nossas pesquisas mostraram repetidas vezes, e não há receita única a ser seguida. Cabe ao líder identificar como cada time funciona melhor, considerando seus diversos integrantes, e utilizar as diversas tecnologias de mídia e comunicação de acordo com as características do time e propósito da comunicação.

NÃO LUTE CONTRA O FUTURO
A flexibilidade cria condições para os trabalhadores darem o melhor de si | por Daniela Diniz

Infelizmente o ano de 2023 foi marcado por muitos líderes, no mundo inteiro, repensando a flexibilidade adotada nos dois anos anteriores e exigindo que seus profissionais reassumissem suas posições – quase como a ordem de generais aos seus soldados. De Salesforce a Zoom assistimos quase que semanalmente ao anúncio de alguma empresa sobre o retorno dos seus funcionários. Segundo uma pesquisa do Gartner do ano passado, 69% dos empregadores de médio e grande porte já estavam exigindo que seus profissionais (incluindo aqueles cujas tarefas podem ser feitas remotamente) voltassem ao escritório entre um e cinco dias na semana.

Nossas pesquisas confirmam a tendência. Em fevereiro de 2022, o relatório Tendências em Gestão de Pessoas, realizado pelo ecossistema Great People e Great Place to Work com 1,7 mil pessoas, apontava que das empresas que já tinham definido uma nova política de trabalho, 66% optaram pelo modelo híbrido; 24% pelo presencial e 10% pelo remoto. O relatório deste ano, publicado também em fevereiro, atualizou o status: 50% no híbrido; 40% no presencial e 10% se mantiveram no remoto. E a pesquisa denominada Trabalho Ideal, também do Ecossistema GPTW, identificou que a maioria das pessoas – 43,8% – já voltou ao modelo presencial igual a era pré-pandemia; 32,8% estão trabalhando num modelo híbrido e 20,2%, no remoto. Quando perguntamos, porém, qual seria o sonho deles nesse ponto, as proporções se invertem: 52,8% preferem trabalhar no modelo híbrido; 31,8%, no remoto e apenas 11%, no presencial. Para 4,9%, isso não faz diferença.

O resultado desse descompasso é uma frustração generalizada pela perda de algo que já havíamos conquistado: a liberdade para trabalhar. Ao serem obrigadas a cumprir uma jornada padrão – que parece ter ficado na pré-história – e se deslocarem de um lado para outro todos os dias, as pessoas vêm perdendo literalmente a fé no futuro do trabalho, que prometia ser mais tecnológico, humano e flexível. Não à toa, pesquisas apontam um alto nível de descomprometimento dos profissionais e expressões como “quiet quitting”, “loud quitting”, “grupmpy staying” e “lazy jobs” indicam um movimento de pessoas descontentes com esse mundo do trabalho atual, deixando claro que vão trabalhar apenas pela sobrevivência e, portanto, farão o mínimo necessário para garantir suas migalhas. Além de triste, esse é um cenário perde-perde-perde: perdem as pessoas, as empresas e a sociedade. Segundo o Gallup, o custo dessa epidemia do desengajamento é de US$ 7 trilhões para a economia.

Por sua vez, a adoção de uma gestão flexível – que vai além do modelo de trabalho – tem se revelado um acelerador para os negócios. Entre as 150 Melhores Empresas para Trabalhar de 2023, por exemplo, 86% oferecem um regime de trabalho híbrido (em 2022, eram 77%) e 27% já estão experimentando uma jornada reduzida (em 2022, 17%). Esse grupo de empresas também é adepto de uma cultura mais flexível – 90% têm formalizado a prática de home office – e investe pesado no desenvolvimento de suas lideranças para serem mais compatíveis com o trabalho do século 21. Resultado? Essas organizações tiveram um crescimento médio anual de 9,6% do faturamento nos últimos dois anos – 159% maior que o aumento do PIB entre o primeiro semestre de 2022 e o de 2023, e um turnover voluntário registrado de 8%, enquanto o do mercado é de 48%. Vamos mesmo lutar contra o futuro?

*Daniela Diniz é jornalista e diretora de conteúdo e relações institucionais do Ecossistema Great People e Great Place to Work. É autora dos livros *Grandes Líderes de Pessoas* e 2*5 Anos de História da Gestão de Pessoas e Negócios nas Melhores Empresas para Trabalhar*.*

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Autoria

Colunista Anna Queiróz

Anna Queiróz

Anna Queiroz é pesquisadora na Stanford University, onde investiga os impactos psicológicos, cognitivos e sociais do uso das tecnologias. Ela foi pioneira no estudo da fadiga do Zoom e seus impactos no ambiente de trabalho, educação, relações interpessoais, saúde e bem-estar. Anna também é referência no uso da realidade virtual na educação, saúde e trabalho. Possui mestrado e doutorado em psicologia.

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