fb-embed

Coprodução HSM Management + Softys

9 min de leitura

Rumo à universalização

Em evento realizado por HSM Management e Softys, especialistas discutem o cenário brasileiro de água e saneamento

Christye Cantero

04 de Agosto

Compartilhar:
Artigo Rumo à universalização

Dona Glória mora em Calcárea, comunidade localizada em Caieiras (SP), e trabalha como cuidadora de crianças. Para conseguir água para beber, cozinhar e limpar a casa, ela precisava acordar mais cedo, conectar a mangueira a uma caixa d'água da Sabesp e bombear a água até a sua casa. A realidade de Dona Glória mudou desde abril deste ano quando a comunidade foi escolhida para ser piloto do projeto Softys Contigo, programa lançado pela Softys – empresa de produtos de higiene e cuidados pessoais – que investirá 6 milhões de dólares para garantir o acesso à água potável e ao saneamento a famílias de áreas vulneráveis na América Latina.

Pelo projeto, a água da chuva é captada, filtrada e armazenada em cisternas de três mil litros. “A princípio, 15 casas foram impactadas e esse é só o pontapé inicial de algo muito maior. Nos próximos cinco anos, a empresa implementará duas mil soluções - cerca de 300 delas no Brasil”, explicou Luis Delfim, CEO da Sofyts no Brasil, durante o Deep Dive by HSM Management “Desafios de água e saneamento no Brasil”, produzido por HSM Management em parceria com a Softys.

Na abertura do evento, Luana Siewert Pretto, presidente executiva do Instituto Trata Brasil, falou sobre o cenário brasileiro de água e saneamento. Segundo um relatório divulgado em junho pelo instituto, 40,1% da água tratada no país é desperdiçada, seja por vazamentos ou por ligações clandestinas, antes de chegar às torneiras, número muito alto, ainda mais se considerarmos que 35 milhões de pessoas não têm acesso à água tratada no Brasil. “Com isso temos menor conservação dos mananciais, porque captamos mais água. Sem contar que temos de um lado a crise hídrica em diversas regiões do país e do outro a perda de grande parte da água produzida”, ressaltou.

Outro desafio está relacionado ao saneamento básico. No Brasil, cerca de 100 milhões de habitantes não têm acesso à coleta e ao tratamento de esgoto. Em 2020, o país despejou na natureza 5.368 piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento por dia. “Isso gera uma série de problemas, entre eles as doenças de veiculação hídrica. A cada episódio de diarreia, por exemplo, a criança falta cinco dias na escola, o que gera atraso escolar e prejudica o rendimento que terá no futuro”, pontuou Pretto.

Investir em saneamento e acesso à água é algo urgente. Um estudo do Trata Brasil mostra que os ganhos econômicos e sociais trazidos pela universalização do saneamento alcançariam R$ 1,1 trilhão. Entre os benefícios estão a melhora do turismo local, redução de internações, ganho de produtividade como um todo, e valorização imobiliária.

Mãos à obra

Depois da keynote, a iniciativa privada e o terceiro setor apresentaram o que estão fazendo para melhorar os índices nacionais. Delfim, da Softys, contou sobre o projeto Softys Contigo e a importância de apoiar iniciativas para minimizar os impactos da falta de saneamento e de acesso à água de qualidade não só no Brasil como em toda a América Latina.

“Na América Latina atendemos mais de 500 milhões de consumidores e observamos que muitas famílias não tinham acesso à água e ao saneamento e queríamos mitigar esse efeito. Daí surgiu o programa Softys Contigo”, disse. Para lançar o programa foi escolhida a comunidade de Calcárea, em Caieiras (SP), onde fica uma das seis fábricas da empresa no país. Lá foram instalados 15 sistemas de captação de água da chuva, solução desenvolvida pela startup mexicana Isla Urbana. Depois do lançamento, a comunidade de Caieiras já recebeu outra solução, desta vez para aumentar a capacidade dos reservatórios de cisternas. Para os próximos 12 meses o plano é chegar a outras comunidades do país nas áreas em que a empresa está instalada, o que já está acontecendo. Em Curitiba, a solução de captação de água de chuva já chegou à região carente perto da fábrica da Softys. Além disso, foram instalados lavatórios públicos para os moradores do bairro Fazendinha, em Recife.

Além da implementação das soluções, a companhia criou uma ação de voluntariado para funcionários e parceiros. “Muitos querem participar de programas de apoio às comunidades e não sabem como fazer. Então o Softys Contigo também é um veículo para viabilizar que as equipes ajudem essas regiões mais vulneráveis”, comentou. Depois de Delfim, Camila Jordan, diretora executiva da ONG Teto Brasil, contou sobre a parceria com a Softys e disse que a ONG entrou para fazer a ponte entre a solução e a comunidade. Para isso, aplicou a metodologia de diagnóstico comunitário que permitiu identificar o perfil das famílias que vivem na área.

O Mapa de Direitos da Teto aponta que ao menos 47% das comunidades onde trabalham não têm acesso regularizado à água. “O problema ainda é urgente, mas é com muito orgulho que continuamos em ação por uma sociedade justa e sem pobreza. Para a Teto é crucial o desenvolvimento comunitário e o impacto social que a construção de projetos como esse promovem. Depois da implantação em Calcárea, alguns moradores que participaram do projeto passaram a dividir a água com seus vizinhos, se empenharam em denunciar a situação da comunidade e em seguir dialogando com a Teto e a Softys para a construção de mais soluções”, comentou Jordan.

Quem falou mais sobre sinergia e alinhamento com a comunidade foi Rogério Tavares, vice-presidente de relações institucionais da Aegea Saneamento. O executivo destacou a importância da proximidade com os moradores nas áreas atendidas pela empresa. “Trabalhamos com o conceito de licença social, que já existia em outros segmentos de infraestrutura, que é legitimar a atuação no território. E isso passa por identificar as lideranças, visitar todas as residências, uma por uma, levantar os problemas, corrigi-los, e tirar da invisibilidade um grande contingente da população, além de apoiar a geração de renda ou capacitação, ou até mesmo contratar mão de obra local”, frisou.

Tavares citou o programa Afluentes cujo objetivo é identificar lideranças nas cidades onde está presente. Segundo ele, esse é um instrumento pelo qual a companhia garante que suas ações estejam em sintonia com a sociedade e o local em que atua. “No caso da concessão do Rio, por exemplo, identificamos mais de três mil líderes comunitários com os quais conversamos. São eles que possibilitam um diálogo tranquilo ao entrarmos em áreas mais vulneráveis. Essas pessoas têm os números de celular dos gestores das respectivas áreas para que possam ter uma comunicação rápida tanto para receber demandas como também para levar problemas”, apontou.

Para finalizar as apresentações, Marilene Ramos, diretora de sustentabilidade e relações institucionais do Grupo Águas do Brasil, discorreu sobre o uso eficiente dos recursos hídricos. Ela comentou que o índice de perdas de água no Brasil é similar a países de terceiro mundo e muito superior àqueles com melhor sistema de saneamento. A executiva comentou que, em território nacional, o Nordeste, local que tem maior escassez, também é onde se tem grandes índices de desperdício. “Mossoró, no Rio Grande do Norte, perde mais de 60% da água que produz e isso se reflete em tarifas mais elevadas. A perda declarada no Nordeste está em 45%, enquanto nas regiões Sul e Sudeste cai para 38%, o que ainda é elevado. O avanço das concessões privadas, como em Alagoas, propiciam investimentos que reduzem esses índices”, explicou.

Ramos contou sobre o programa Água de Valor, implantado há três anos e que resultou na redução de mais 17 milhões de metros cúbicos por ano, o suficiente para abastecer uma cidade de 270 mil habitantes. E também comentou sobre o caso da Águas de Votorantim, no interior de São Paulo, que trabalha com uma startup que desenvolveu uma tecnologia que consegue detectar os vazamentos pelo som da água passando na canalização. Resultado, as perdas hoje são de 18%. “Isso exige investimento, tecnologia e dedicação, mas pode se estender para outras regiões do Brasil onde as concessionárias privadas estão atuando”, disse.

Desafios

Para cumprir a meta do Novo Marco Legal do Saneamento, de garantir que 90% da população tenha acesso à coleta e tratamento de esgoto e 99% à água potável até 2033, o Brasil precisa baixar as perdas de água tratada para 25%. O que, então, deve ser prioridade quando se fala de água e saneamento?

A presidente executiva do Trata Brasil ressaltou a importância da conscientização sobre o tema tanto das pessoas, para cobrar investimentos do poder público, quanto dos governantes para que entendam a relevância da questão do saneamento. Sobre a universalização, a executiva acredita que será possível que aconteça até 2033 e que há regiões no Brasil que já estão à frente, com previsão de grandes investimentos e boa perspectiva futura, mas há outras que precisam urgentemente mudar o modelo de gestão e buscar soluções. “O novo marco é muito bom porque traz segurança, centralização da regulação na Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), e isso trará melhor operação do saneamento básico e maior cobrança pela eficiência e avanço dos indicadores. É importante que a população entenda que cada cidadão tem voz para cobrar por esse serviço que faz parte da sua dignidade, de algo essencial para a sua vida”, afirmou Pretto.

A diretora executiva da ONG Teto Brasil comentou que a prioridade é ter políticas públicas desenhadas e contempladas pensando na população mais vulnerável. “Temos 14 milhões de pessoas que moram em favelas, com acesso muito precário à água e saneamento. O grande impulsionamento tem de acontecer até 2033 junto a essas populações para que, mais uma vez, não fiquem para trás”, considerou Jordan.

Já o CEO da Softys no Brasil apontou que há três prioridades. A primeira, como empresa, é ser cada vez mais eficiente no processo produtivo, reduzindo, assim, os efeitos no entorno e no meio ambiente. A segunda é impactar positivamente as comunidades ao redor de suas fábricas, o que acontece por meio da plataforma Softys Contigo.

A terceira prioridade está relacionada às políticas públicas. “Como empresa temos mais voz do que uma pessoa sozinha. O tema água e saneamento tem um grande problema que é o de não ter visibilidade, ele fica escondido embaixo da terra. Boa parte da classe política não coloca energia para resolver um problema estrutural como esse. Elegemos essa causa para pressionar, influenciar e cobrar que o poder público faça seu papel”, finalizou Delfim.

É com investimento, tecnologia, conscientização, vontade política e projetos inovadores que será possível melhorar o acesso da população ao saneamento básico e à água tratada para que se atinjam as metas estabelecidas no Novo Marco Legal do Saneamento.

Quer saber mais sobre essa rica discussão? Acompanhe aqui tudo o que aconteceu no Deep Dive by HSM Management “Desafios de água e saneamento no Brasil”.

Compartilhar:

Autoria

Christye Cantero

Christye Cantero é editora de conteúdos co-branded na HSM Management