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IA na gestão de projetos: um case de sucesso

Com metodologia que combina boas práticas em gestão de projetos de ti, A fintech DMcard obteve resultados em seis meses

Colunista Alexandre Nascimento

Alexandre Nascimento

15 de Setembro

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Artigo IA na gestão de projetos: um case de sucesso

Muitas pesquisas apontam que a inteligência artificial (IA) será cada vez mais presente, substituindo desde pessoas até modelos de negócio. Outras tantas demonstram como as empresas ainda têm dificuldade em adotá-la. Por isso, compartilho um caso de sucesso de implantação de IA.

Comandada por Denis Correia, a DMCard oferece soluções de concessão de crédito. O projeto se iniciou no contexto de uma grande transformação, que propunha a criação de uma cultura de tomada de decisões com maior utilização de dados. Juan Agudo, diretor de inovação da DMCard, teve a visão de criar uma fábrica de modelos. Com uma mentalidade aberta à inovação, a diretora da área de risco de crédito e ciência de dados, Edna Kohigashi, comprou a ideia. E me convidou para participar desse projeto.

Usamos uma metodologia de adoção acelerada de IA em negócios chamada AIxCeleration. Criei essa metodologia com base nos resultados de pesquisas que realizei com centenas de empresas sobre os fatores que influenciam a adoção e o sucesso na utilização de IA nos negócios. Essa metodologia emprega uma combinação de boas práticas em gestão de projetos de tecnologia da informação para evitar os principais problemas identificados em pesquisas sobre as causas raiz do insucesso nas empresas. E, como o nome diz, procura adotar a IA de forma acelerada.

Diagnóstico baseado em pesquisas

O trabalho basicamente se apoiou em três fases (veja a Figura 1). Na fase de diagnóstico, o objetivo foi identificar quais oportunidades ou lacunas poderiam ser resolvidas com IA. Essa fase inicial também teve como objetivo conectar o projeto de aceleração de adoção com a estratégia empresarial. De fato, a falta dessa conexão foi identificada em pesquisa como um dos fatores que leva as tentativas de implementação de IA ao insucesso. Inicialmente, foi feito um levantamento com cada uma das áreas de negócios da empresa, no qual foram identificadas oportunidades de utilização de IA para aumentar a geração e a captura de valor. Com isso, o problema da “ausência de requisitos de negócios”, identificado em pesquisas de projetos que não obtiveram sucesso na adoção de IA, foi resolvido.

Para fazer a conexão do projeto com a estratégia da empresa, foi empregada uma técnica de scoring (pontuação) do potencial impacto que cada uma das oportunidades poderia gerar no atingimento das metas estratégicas da empresa, com o uso de OKRs (Objectives and Key Results). A metodologia de scoring utilizada foi desenvolvida para envolver a liderança da empresa de forma a reduzir vieses e, com isso, resolver outro fator de risco para os projetos de adoção de IA identificados em pesquisas: a falta de suporte e de envolvimento da liderança estratégica.

Ainda na etapa de diagnóstico, outra boa prática utilizada foi a lean matrix (matriz enxuta) para abordar outros fatores que contribuíram de forma significativa para o fracasso de diversos projetos de adoção de IA em organizações. As pesquisas apontam que algumas organizações falham em encontrar um ponto de partida ou caso de uso certo, outras tentam aplicar na otimização dos processos errados, ou falham em identificar o problema certo para aplicarem soluções de IA, ou ainda começam com projetos “grandes” demais. Para a elaboração da lean matrix, a pontuação gerada durante o processo de scoring foi utilizada como uma medida aproximada do potencial de geração de valor para a empresa, juntamente com uma estimativa do esforço envolvido na implementação de cada uma das demandas.

Com isso, os projetos foram distribuídos nos quatro quadrantes da matriz. Os projetos identificados como aqueles que demandam um grande esforço e têm valor potencial baixo para o negócio ficaram no quadrante “X”, chamado de “perda de tempo”. Esse quadrante identifica os projetos que deveriam ser a última prioridade para a empresa. Já aqueles com um valor potencial baixo e com um esforço de implementação baixo ficaram no quadrante “?”, chamado de “dúvidas”. Tais projetos devem ser avaliados mais cuidadosamente, pois não são a prioridade imediata da empresa, mas também não devem ser tratados como última prioridade. Os projetos de elevado valor potencial e que requerem um esforço elevado ficaram no quadrante “2”, apelidado de “grandes apostas”. Muitos desses projetos são atraentes e têm potencial muito elevado de retorno. Sua atração, porém, muitas vezes vem da percepção de grandiosidade que despertam – e por isso muitos gestores erroneamente acabam optando por iniciar a jornada de implantação por eles, o que aumenta o risco do projeto de adoção de IA e provoca taxas elevadas de insucesso.

Por fim, as demandas com elevado valor potencial para o negócio e que demandam um esforço baixo para serem implementadas ficaram no quadrante “1”, apelidado de “ganhos rápidos” ou “quick wins”. Essas são as demandas que devem ser priorizadas pela empresa – e que, portanto, foram o alvo inicial da DMCard.

Lean matrix na prática

Na fase de planejamento, o atendimento das demandas identificadas como ganhos rápidos foi pensado a partir da distribuição delas ao longo de iterações de um mês de duração cada. Esse prazo de um mês foi adotado para forçar o atendimento de três premissas importantes. A primeira delas é o desenho de cada uma das demandas conforme uma abordagem análoga ao MVP (da sigla em inglês para mínimo produto viável), que apelidamos de MVM (da sigla em inglês para mínimo modelo viável). Assim, busca-se validar o atendimento do essencial, ou seja, trazer o maior valor para a área de negócios.

A segunda premissa é uma abordagem ágil, com sprints semanais, buscando colocar na mão do cliente interno resultados preliminares para validação em poucos dias. Por fim, a terceira premissa é a de que o intervalo imutável de um mês para atender cada demanda cria o efeito de esteira de produção, fazendo com que o senso de prioridade dos executivos das áreas de negócio seja capturado pelo processo, visto que a entrega será o que “couber” dentro do mês. Assim, quanto maior a atenção e menor o atrito, melhor e mais completa será a entrega final, criando um alinhamento de interesses.

Cada iteração se iniciou com um levantamento para validação dos requisitos para evitar outra causa raiz de insucesso em projetos de adoção de IA identificada nas pesquisas: problemas nos requisitos de negócios.

Logo em seguida, um kick-off foi realizado para apresentar a demanda para o time de cientistas de dados responsável pelo desenvolvimento dos modelos de IA. Aqui, mais um fato surpreendente. A DMCard combinou o projeto com seu programa de estagiários em ciência de dados. Assim, a progressão da dificuldade e do esforço gerados pela priorização com o uso da lean matrix foi convenientemente orientada à formação dos estagiários, de forma que o programa de aceleração de adoção de IA ofereceu uma abordagem de aprendizado baseada em problema (PBL – Problem Based Learning). Assim, o time responsável pela implementação dos modelos foi um time de estagiários recém-contratados pela empresa, que contaram com a minha mentoria técnica no desenvolvimento de modelos de IA.

Após o kick-off, entramos na terceira fase, de implementação, com um hackathon, realizado em cada uma das iterações iniciais. Com isso, em um intervalo de tempo curto, os cientistas de dados validaram as hipóteses e premissas que trazem mais risco para o sucesso na criação do modelo, permitindo-nos ter uma visão mais clara do que seria o MVM, bem como validar com a área de negócio solicitante. Ou seja, o objetivo do hackathon foi o desenvolvimento de uma prova de conceito. Em seguida, o time passou a desenvolver e refinar modelos em sprints semanais, envolvendo um representante da área de negócios como ponto de contato para validações. Dentro do time de cientistas de dados, um product owner (PO) foi escolhido para cada iteração de um mês, para ser o ponto de contato com o representante da área de negócios, fazendo a interface dela com os demais membros do time. Assim, puderam também treinar soft skills, como liderança e comunicação Em cada iteração de um mês, realizamos reuniões de acompanhamento semanais para mentoria técnica e de negócios dos estagiários, bem como para validação dos desenvolvimentos em cada sprint. Ao final da iteração, um preparo para a próxima foi realizado com a realização de um workshop, enquanto o time validava os detalhes finais para a entrega e a colocação do modelo em produção.

Com o amadurecimento da equipe, foi possível dividi-la em dois times, o que gerou escala. Tal fato, somado com o empenho da área de TI, liderada por Fernando Oliveira e com a gestão de Carlos Barbieri, garantiu que todos os ganhos rápidos que haviam sido planejados para serem entregues em 12 meses chegassem em apenas seis meses. De fato, o empenho da área de TI foi essencial para garantir todo suporte e velocidade necessários para colocar os modelos em produção.

Por fim, uma avaliação dos seis meses de projeto mostra o poder da abordagem AIxCeleration. A DMCard deverá alcançar o payback em quatro meses e um retorno sobre o investimento (ROI) de 233% em 12 meses. Como parâmetro de comparação, segundo levantamento feito pela Deloitte em 2020, na média o ROI e o payback de projetos de IA foram de 4,3% e 1,2 anos, respectivamente. A superioridade do resultado da metodologia se deve ao efeito de espiral positiva criado pela combinação de boas práticas, alinhamento de incentivos e reforço positivo decorrente da rápida materialização das demandas. Tal efeito gera momentum suficiente para que as potenciais barreiras individuais à adoção de IA sejam superadas.

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Colunista Alexandre Nascimento

Alexandre Nascimento

Alexandre Nascimento

Alexandre Nascimento é um engenheiro empreendedor e professor da Singularity University, apaixonado por inovação desde a infância. Dedica-se à pesquisa científica aplicada e ao desenvolvimento de novos produtos. Tem passagem por prestigiadas universidades e empresas no Brasil, Ásia, Europa e EUA, com dezenas de publicações e patentes.

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