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Estratégia e execução

18 min de leitura

Histórias que inspiram

Empresas que já investem em diversidade e inclusão contam como as novas políticas impactaram positivamente diferentes indicadores da empresa

24 de Outubro

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Artigo Histórias que inspiram

Se antes, diversidade era apenas uma preocupação do time de recrutamento e seleção, hoje, está ligada diretamente à cultura, à produtividade, à capacidade de inovação e ao desempenho financeiro da empresa. Evoluiu: não há como falar em diversidade, sem inclusão e pertencimento, ou seja, a sensação de segurança psicológica que permite que os funcionários sejam suas melhores versões no trabalho. Aqui, separamos bons exemplos de como as empresas estão expandindo seu mindset. 

Aegea e a diversidade racial

Promover a equidade nas oportunidades de acesso à empresa e de crescimento profissional dos colaboradores que se autodeclaram pretos e pardos. Esse é o objetivo do programa “Respeito dá o tom”, da Aegea, empresa de saneamento que atua em 11 estados brasileiros. O primeiro passo foi mudar as regras para seleção dos trainees, flexibilizando exigências como, por exemplo, fluência em inglês. Em vez de buscar candidatos apenas nas universidades de primeira linha, a empresa passou, também, a divulgar suas vagas em coletivos negros, comunidades quilombolas e redes sociais. Se no primeiro ano de programa, a aprovação de negros foi de 5%, no terceiro, passou para 75%. “Deparamos com candidatos com potencial imenso, mas que, por falta de oportunidades durante a formação, não tiveram acesso a alguns conhecimentos exigidos pelo mercado”, comenta Josélio Raymundo, diretor de operações da Aegea. Ao escolher não perpetuar esse ciclo de exclusão, a empresa oferece um plano de desenvolvimento profissional em sua academia de formação para que esses trainees aprimorem conhecimentos. “Queremos que eles alcancem cargos de liderança”, diz Raymundo, “pois nossa ambição é que passemos a espelhar, nos diferentes níveis da organização, a demografia das 48 cidades em que atuamos”.

No Brasil, apesar de os negros corresponderem a 55% da população, apenas 5% deles ocupam cargos de liderança – número que cai para 1% quando se fala em mulheres negras; os dados são do IBGE e Instituto Ethos. 

Raymundo entende o desafio que tem pela frente. Ele próprio, negro, se viu desconstruindo ideias preconcebidas ao se aprofundar no entendimento das questões raciais. “Mudei radicalmente. Achava que, como negro, ascender na carreira estava relacionado à meritocracia. Ao longo do processo para a formatação do programa vi que eu era uma enorme exceção”, conta. Nessa jornada, a empresa contou com a importante ajuda da consultoria externa Instituto Identidades do Brasil (ID_BR) e de uma funcionária especializada no tema contratada exclusivamente para apoiar a empresa nessa construção. “Com esse apoio, traçamos ações estruturadas para criar a cultura da diversidade racial”, lembra o diretor. 

“Bem diferente de uma corrida de cem metros, entendemos que se trata de uma maratona e estamos só no começo”, diz ele. Alguns resultados já são percebidos, como o clima interno e o orgulho em pertencer à organização, em forma de feedbacks e comentários espontâneos que as lideranças passaram a receber. “Nem imaginávamos tantos, desde, por exemplo, mulheres dizendo que pararam de alisar os cabelos, pois passaram a se aceitar, a colaboradores brancos sensibilizados pelo programa”, comenta. 

O “Respeito dá o tom” possui sua própria governança e é visto como um agente de transformação. Além de comitês e rodas de conversa, que contam com a participação do CEO e lideranças, fazem parte dele também cartilhas e vídeos informativos sobre temas diversos dentro da questão racial. 

SAP e a Neurodiversidade

“Ser autista na SAP é encarado como uma vantagem, não só uma deficiência. As pessoas que trabalham aqui respeitam as diferenças”, conta Marcia Machado, autista, desenvolvedora de software na SAP Labs Latin America. Ela faz parte do grupo de 15 funcionários brasileiros com espectro autista contratados no programa “SAP Autism at Work”, que faz da neurodiversidade uma prioridade e busca promover iniciativas para diminuição do preconceito. Implementado também em países como Alemanha, Argentina, Austrália, Canadá, Estados Unidos, Irlanda, Índia e República Tcheca, o programa viabilizou a contratação de 160 colaboradores, que trabalham em 21 funções diferentes. 

“Quando começamos o programa na Índia”, lembra Niarchos Pombo, líder de diversidade na SAP Brasil e América Latina, “imaginávamos que os colegas que faziam parte do espectro autista pudessem trabalhar em um grupo predefinido de funções. Com o passar do tempo, verificamos que temos autistas bem-sucedidos em todas as áreas, desde vendas até recursos humanos, e desmistificamos o estereótipo de que existem funções predefinidas. Nesta jornada da diversidade, aprendemos muito, e hoje temos um modelo mais maduro para a gestão do programa”. 

De fato, o programa vem avançando. “Antes, as chamadas dificuldades das pessoas com autismo eram o centro dos debates para a inserção no mercado, mas agora o foco está em como suas habilidades associadas podem colaborar em diferentes funções”, diz Eliane Demitry, gerente de RH da SAP Brasil. “A maioria dos autistas tem boa memória, grande atenção aos detalhes e facilidade para detectar erros e coisas fora do padrão”, completa ela. 

O programa é uma iniciativa pioneira no mercado de tecnologia e a expectativa é que ele inspire outras companhias. “Iniciei no ‘Autism at work’ em 2015, recebendo todo o suporte necessário. O sentimento de pertencimento veio rápido, com apoio do time, da gerência e do RH. Trabalhar aqui deixa meus dias mais leves porque sei que minhas peculiaridades são aceitas e respeitadas. Eu posso ser eu mesma”, lembra Marcia Machado.

Tendo a diversidade como um dos seus pilares, a SAP desenvolve iniciativas para promover um ambiente inclusivo. Mantém, por exemplo, os “employee network groups”, que são as redes de funcionários que englobam grupos minoritários de Mulheres, LGBTQ+s, Gerações, Raça/Etnia e Pessoas com Capacidades Diferentes (PCDs). Essas redes garantem a representatividade na SAP e atuam no engajamento interno para políticas antidiscriminação. “O melhor caminho para instituir políticas de inclusão é dar voz aos diversos grupos para que eles mesmos possam, de acordo com seu lugar de fala, opinar sobre o que é ou não importante para eles”, comenta Pombo. Pesquisas da empresa descobriram que, quando os funcionários sentem que são tratados com respeito e têm sentimentos de pertencimento, eles são oito vezes mais propensos a alcançar melhores resultados nos negócios, seis vezes mais propensos a inovar e duas vezes mais propensos a atender ou exceder as metas financeiras. 

Votorantim Cimentos e as mulheres na liderança

 “Somar pessoas diferentemente iguais.” Esse é o significado da diversidade para a Votorantim Cimentos. “É não fixar um padrão e ter mente e coração abertos para respeitar ideias, opiniões e identidades diferentes”, diz a cartilha que esclarece uma série de conceitos e condutas para tornar o ambiente de trabalho mais inclusivo. Nos últimos anos, a empresa tem trabalhado na sensibilização dos temas com discussões abertas sobre pessoas com deficiência (PCD), gênero, raças e LGBTQ+. 

As discussões de gênero estão focadas no empoderamento feminino. “Sabemos que há, no setor de construção, oportunidade para melhorar a inclusão do público feminino, especialmente nas operações de fábricas e cargos de liderança”, diz a gerente geral de gente Bruna Perpetuo. 

Para aumentar essa participação, a empresa lançou o “Programa de estágio técnico para mulheres”. As 15 selecionadas passarão por um ciclo de desenvolvimento apoiado pela Escola Técnica da Votorantim, com o desafio de entregar projetos na área de atuação. As estagiárias serão acompanhadas por líderes da empresa, garantindo seu desenvolvimento. “Temos um programa de mentoria voltado às profissionais com potencial de assumir cargos de liderança no futuro”, explica Cristiano Brasil, diretor global de gente, gestão e comunicação.

A empresa também fez alterações em seu processo de seleção de trainees. Pelo segundo ano, a seleção acontece às cegas e a lista de pré-requisitos se resume a apenas dois itens: candidatos formados no ensino superior e que tenham nível intermediário de inglês. “Esse tipo de recrutamento elimina julgamentos precipitados e, ao mesmo tempo, valoriza aspectos profissionais, características técnicas, competências, habilidades e tendências comportamentais dos candidatos. As informações pessoais, como nome da faculdade que cursou, formação e idade não são relevantes”, diz Brasil. “Passamos a valorizar a história de vida do candidato e sua conexão com a organização. Eliminamos o teste de inglês e lógica, e substituímos por uma etapa na qual o candidato participa de uma ação voluntária de construção de moradias para comunidades de baixa renda”, conta ele. 

Adriana Celestino, de 45 anos, a primeira empregada a assumir a liderança de uma fábrica da Votorantim Cimentos no País, é um exemplo desse esforço da empresa em alterar a realidade vigente. No comando de 230 empregados na unidade de Corumbá (MS), ela sempre desejou chegar ao mais alto cargo na fábrica, apesar de reconhecer que ainda é um setor dominado pelo sexo masculino. Para ela, tão fundamental quanto ter o desenvolvimento de carreira como uma das prioridades de vida é trabalhar em um ambiente que apoia e incentiva o crescimento do profissional, independentemente de sua cor, raça ou sexo. “Desde o dia em que entrei na companhia, sempre estive envolvida em atividades de destaque e com interface com várias áreas. Também obtive conhecimentos de áreas que até então não tinha experiência, como estratégia comercial e marketing, o que acredito que não conseguiria com tanta facilidade em outra empresa”, afirma. A gerente da fábrica ressalta que o bom clima organizacional faz a diferença para o desenvolvimento profissional. “Fui muito bem recebida pela equipe e o que quero agora é construir um legado sólido. Meu maior desafio é melhorar cada vez mais o desempenho da unidade, posicionando-a entre as mais produtivas da companhia”, acrescenta Celestino.

Para o diretor Cristiano Brasil, a evolução do tema internamente é gratificante. “Diversidade jamais pode ser tratada como modismo, ou um tema restrito ao RH, ou ainda ser discutida em eventos a cada seis meses. Mas sim ser um tema constante de toda organização, patrocinado principalmente pela alta liderança. Quando é assim, ele frutifica e traz ganhos como, por exemplo, maior assertividade nas decisões, que já é um resultado concreto para nós”, diz. 

Basf e a diversidade LGBTQ+

A BASF mantém quatro grupos de afinidades, formados por colaboradores voluntários, dedicados aos públicos LGBTQ+, mulheres, negros e PCD, que promovem o tema interna e externamente, encaminhando as demandas para mudanças concretas. Os grupos analisam desde os processos seletivos, passando pelos programas de desenvolvimento e retenção de talentos, até a cadeia de fornecimento, cujos parceiros são informados sobre as políticas de inclusão da empresa e estimulados a ampliar seus esforços de valorização das diferenças. “Temos uma governança estruturada que contribui para que as iniciativas de diversidade sejam transversais. Esse tema foi abraçado pela liderança e seus desdobramentos são debatidos em todas as esferas, começando pelo Comitê Executivo, liderado pelo presidente”, diz Cristiana Xavier de Brito, diretora de relações institucionais e de sustentabilidade da BASF para América do Sul. Ela sabe que ainda há um caminho pela frente para que a realidade reflita plenamente a diversidade. “Estar na vanguarda desse tema é um constante processo de gerirmos nossa organização, revisitando nossas políticas, realizando treinamentos entre nossas lideranças e, com apoio dos grupos de diversidade, nos colocarmos à disposição para ouvir, aprender e melhorar continuamente nossas práticas”, diz. 

O último censo, realizado pela companhia na América do Sul, mostrou que 5% dos seus colaboradores na região autodeclaram-se homossexuais ou bissexuais. Um dos 34 integrantes do grupo LGBT+, o desenvolvedor de experiências Carlos Henrique Almeida, participa ativamente das frentes de comunicação e ações. “Além de dar ideias e opiniões, eu aprendo muito sobre a realidade e as necessidades das outras comunidades, como trans e lésbicas”, conta. 

Nem sempre Almeida ficou tão à vontade no ambiente corporativo. “Em outra empresa, certa vez, precisei viajar com um grupo de vendas e senti que os homens estavam desconfortáveis em escolher quem dividiria o quarto comigo, por ser gay, já que era uma premissa da empresa ficarmos hospedados em duplas. Eu me senti muito mal e excluído. No fim, deu certo e um colega se ofereceu”, diz. Para ele, o fato de a BASF defender a diversidade é muito significativo: “Eu posso ser quem sou, sem esconder de ninguém. Meus colegas de trabalho me respeitam”. 

Bosch e as Pessoas com Deficiência (PCD)

Um dos pilares da diversidade da Bosch é a inclusão de pessoas com deficiência, no qual a empresa valoriza a competência para a vaga e não a deficiência. “Seguimos um modelo de design thinking que nos ajuda a selecionar candidatos por seu valor, e levamos em conta tudo o que aprendemos com nossos colaboradores com deficiência para enriquecer esse recrutamento”, comenta Fernando Tourinho, diretor de recursos humanos da Bosch na América Latina. 

A presença de PCDs, que na Bosch ultrapassa a lei da cota de 5%, transformou áreas. “Verificamos mais cooperação, empatia, amizade e a criação de vínculos verdadeiros”, observa. Para atingir esse resultado, a empresa precisou fazer mudanças e abrir-se para aprender. A primeira mudança foi física, ao adaptar espaços de trabalho para melhor mobilidade. A fábrica de Campinas, por exemplo, com área de 540 mil metros quadrados, passou a contar com carrinhos elétricos para melhorar a locomoção na planta. 

Já a segunda mudança demandou um novo mindset. Uma consultoria externa, especializada no tema, foi contratada para ajudar a empresa nos primeiros passos de sensibilização dos funcionários. Comitês com colaboradores com deficiências foram estruturados e, com as discussões geradas, os gestores expandiram sua visão, seguindo o lema “Nada sobre nós sem nós”, que, em outras palavras, significa: “Nenhum resultado a respeito das pessoas com deficiência haverá de ser gerado sem a plena participação das próprias pessoas com deficiência”. “É muito importante respeitar o lugar de fala na hora da tomada de decisão”, reforça ele.

A Bosch Brasil iniciou, então, o programa “Embaixadores da inclusão” que, em 2018, recebeu o prêmio global Boas Práticas de Empregabilidade para Trabalhadores com Deficiência, da ONU. Os mais de 300 embaixadores são colaboradores capacitados em inclusão de pessoas com deficiência “e ajudam a disseminar a cultura inclusiva, contribuindo para a mudança da cultura organizacional”, diz Tourinho. 

Essa nova visão impactou até mesmo a forma como eram feitas as comunicações de vagas da empresa. Se antes eram usadas fotos padrão de banco de imagens, agora são usadas fotos de colaboradores reais em toda a sua diversidade, negros, PCDs, LGBT+. “Hoje, essas peças refletem a nossa diversidade, e notamos uma maior atratividade no mercado”, diz. Atrair melhores candidatos é outra consequência da diversidade. “Vemos a diversidade como um potencial para o sucesso da empresa e como um fator diferenciador em sua atratividade como empregador. Sem contar que ideias e perspectivas diferentes são essenciais no processo de desenvolvimento de um produto”, finaliza Tourinho.

Linkedin e a campanha “#ProudAtWork”

Enriquecer as discussões sobre diversidade na sociedade, aumentando a sensibilização e a conscientização sobre os temas tornou-se uma das bandeiras do LinkedIn. Desde 2017, a rede social divulga, no Brasil, sua campanha “#ProudAtWork”, que serviu de piloto para a veiculação em outros países, sobre o papel das empresas na inclusão LGBT+ e a importância da criação de ambientes mais diversificados e inclusivos. “Focamos em quebrar esse tabu que ainda existe no meio corporativo”, explica Alexandre Ullmann, diretor de recursos humanos do LinkedIn para a América Latina. 

A campanha deste ano contou com um vídeo sobre a história de Yasmin Vitória, uma mulher negra e transgênero, que trabalha como estagiária na Salesforce, amplamente compartilhado em todas as redes sociais. A estagiária, em seu depoimento, diz o quanto se sentir pertencendo genuinamente, pela primeira vez, a um ambiente de trabalho impactou sua vida como um todo. Esse fato ilustra os dados da pesquisa encomendada pelo LinkedIn sobre inclusão LGBT+: ao serem perguntados sobre o que esperam do ambiente de trabalho em apenas uma palavra, a maioria cravou “respeito”. “É impressionante, pois isso é o mínimo que qualquer pessoa espera de um ambiente de trabalho!”, comenta Ullmann. 

Percebe-se, assim, que diversidade não é uma questão de trazer diferentes perfis para dentro da empresa, mas sim de fazê-los se sentirem pertencentes àquele ambiente. “Quando a promoção da igualdade é autêntica dentro da cultura organizacional, a diversidade resulta em maior produtividade, pois o colaborador está satisfeito, há melhor clima interno e mais transparência, já que ele não precisa gastar energia escondendo sua essência”, comenta.

Muitos ainda escondem. A pesquisa descobriu que, no Brasil, 35% dos colaboradores LGBT+ sofreu discriminação por conta de sua orientação sexual (outros 25% nunca se assumiram, por medo). Daí a importância das campanhas e das pesquisas. “Realizamos muitos eventos em parceria com grandes empresas em que discutimos vieses inconscientes, preconceitos velados e o real significado da diversidade no ambiente de trabalho”, diz ele, que sugere: “Para mudar a realidade é fundamental que as empresas se envolvam, façam benchmarking, busquem referências e, principalmente, tenham amplo incentivo da alta liderança”. É papel das empresas, em sua visão, criar um ambiente acolhedor e respeitoso e com políticas sólidas, para que cada vez mais esses talentos possam vivenciar a sua vida pessoal em conjunto à profissional, e não como duas pessoas distintas. Quem sabe, assim, alterar também os números de colaboradores LGBT+ na liderança das empresas brasileiras: apenas 13% deles ocupam um cargo de diretoria ou C-level; 54% estão em cargos de entrada, isto é, analistas, assistentes ou estagiários(as).

Internamente, o LinkedIn mantém comitês de profissionais LGBT+, de diversidade racial, de pessoas com deficiência e outro de mulheres. Os grupos realizam debates e eventos, de forma constante, nos quais expõem questões importantes para seus interesses. “É importante estar atento a esta voz. A partir dela, aperfeiçoamos campanhas internas de sensibilização para a diversidade e adaptamos processos de recrutamento”, comenta Ullmann.

Mattos Filho e a diversidade religiosa

De acordo com o Artigo 5º da Constituição, a liberdade de consciência e de crença é inviolável, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida a proteção aos locais de culto e a suas liturgias. Entretanto, não é raro que a conciliação da fé com a profissão exercida seja tarefa difícil para alguns profissionais. De olho nisso, o escritório de advocacia Mattos Filho iniciou o projeto “LiRe”, um grupo de afinidade que busca garantir o exercício do direito à liberdade religiosa, assegurar que os profissionais sejam respeitados na prática de suas crenças e implementar ações para viabilizar essa liberdade no dia a dia, coibindo o preconceito e a intolerância. Todos os profissionais do escritório, inclusive ateus e agnósticos, são convidados a participar dos debates. “Temos funcionários muçulmanos, judeus, adventistas, evangélicos, enfim, e a intenção é que todos estejam à vontade para manifestar suas crenças livremente, promovendo o diálogo e o respeito pelas tradições e práticas específicas”, comenta Luiz Felipe Ferraz, sócio da Mattos Filho. 

Esse é o mais recente grupo de afinidade do escritório, que já conta com outros quatro: raça, mulher, PCD e LGBT+. Ferraz participa ativamente do grupo LGBT+. “O mundo jurídico é unidimensional na medida em que temos todos a mesma formação acadêmica, direito, daí a importância de expandir o olhar para a diversidade de crenças e vivências”, diz. Os grupos, que somam três anos, têm sua própria governança e cronograma de atividades, que incluem ciclo de debates, patrocínios de eventos externos e campanhas. 

Na visão do advogado, os programas têm mudado mentalidades e colecionam vitórias graduais, como a contratação de duas mulheres trans para o escritório do Rio de Janeiro. 

A advogada Marina Anselmo, que atua no grupo de afinidade das mulheres, é mentora de uma jovem negra que entrou como estagiária pelo programa “Soma Talentos”. “É incrível acompanhar a evolução dela e sua satisfação em fazer parte de um grande escritório de advocacia, coisa que ela achava que nunca aconteceria”, lembra. Na última edição do programa, 16 estudantes autodeclarados negros ou pardos foram contratados como auxiliares jurídicos, e passaram a contar com aulas de inglês, português jurídico, capacitação comportamental, mentoria e encontros temáticos. A intenção é aumentar o acesso de profissionais negros ao mercado jurídico, já que, segundo o censo realizado pela Aliança Jurídica pela Equidade Racial, em 2018, apenas 2% dos profissionais, nos maiores escritórios de advocacia do País, são negros. 

Siemens e a licença parental para funcionários homoafetivos

Como atuar frente a um caso que nunca aconteceu antes? Com sensibilidade e empatia. Foi assim que a Siemens protagonizou um dos primeiros casos de extensão, para um funcionário gay, da licença-parental, que prevê a ausência remunerada para poder tomar conta de uma criança.

Everton Lopes, gerente de vendas e marketing da Siemens, alimentava desde a adolescência o desejo de ser pai. Quando conseguiu concretizar o sonho, em 2018, por meio de barriga solidária, procurou o departamento de recursos humanos da empresa, que então criou uma equipe multidisciplinar para atender a essa demanda. Sylmara Requena, diretora de recursos humanos da Siemens no Brasil, iniciou um grande exercício para chegar ao melhor modelo, já que era um caso inédito. 

Hoje, a licença-parental da Siemens, estendida a qualquer funcionário que opte por essa variante, segue as mesmas diretrizes da licença-maternidade. Everton, que agora é pai de gêmeos de cinco meses e se prepara para voltar ao trabalho, sentiu-se apoiado: “Tenho a empresa ao meu lado”, comenta.

Para tornar realidade a extensão desse direito a outros grupos, foram realizadas consultas com escritórios de advocacia pela equipe da área jurídico-trabalhista para verificar a existência de precedentes nesse sentido. Também se buscou melhores práticas na América Latina, pelos líderes das áreas de benefícios e diversidade. A Siemens decidiu implementar de imediato a nova modalidade da licença para toda a companhia, ainda que seja por meio de seus próprios recursos – não há subsídios do governo. “Essa iniciativa coloca em prática nossa missão de tornar real o que importa. A diversidade é, de fato, algo muito importante para nós, e acreditamos que assim incentivamos outras empresas no mercado brasileiro”, afirma Requena. 

O respeito ao diverso está no código de conduta, e qualquer denúncia de discriminação é investigada prontamente e punições são feitas. “Nosso posicionamento é forte em relação a isso. Discurso e prática precisam andar juntos e, por isso, não abrimos mão da consistência em nossas ações”, frisa a diretora.

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