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Desenvolvimento pessoal

4 min de leitura

2020: o ano que não aconteceu

Sobre baratas, Marlon Brandon e outras revelações nada sabaticosas deste nosso não-ano

Colunista Marcelo Nóbrega

Marcelo Nóbrega

21 de Julho

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Artigo 2020: o ano que não aconteceu

Assim como um inseto asqueroso, não somos mais do que hóspedes de passagem por este ‘pálido ponto azul no universo’, como diria o astrofísico Carl Sagan. Mas a nossa (pretensa) inteligência superior nos ilude, e damos por certo que a Terra gira ao redor do umbigo humano.

O avanço científico e tecnológico que nos permitiu voar, alterar cadeias genéticas, curar doenças e aumentar nossa longevidade contribui com essa sensação de onipotência. Temos poderes dignos de deidades, ora! Somos até capazes de ensinar máquinas a raciocinar como gente e.. ops, isso já seria suficiente para colocar em dúvida toda essa nossa inteligência...

Vivemos o mito de Narciso, sem nos darmos conta de que somos apenas um mísero ser entre os mais de 8 milhões que habitam - temporariamente - o planeta. O mundo perde três espécies por hora, segundo a ONU. Nem sempre por causa de um meio ambiente hostil. Há vezes em que o fim está ligado ao desrespeito aos limites. E isso não acontece apenas com animais dito irracionais.

Dá pra dizer que, à nossa maneira, estamos cometendo os mesmos erros que os Maias, Rapa Nui, Khmer, Caetés: invadimos espaços onde não somos bem-vindos, mudamos a paisagem e o relevo com edificações e desmatamento; transferimos plantas e animais de seus habitat naturais; descartamos lixo desordenadamente; consumimos bem mais do que precisamos. Agredimos o planeta. Vai ter revide.

A redução da atividade econômica e o isolamento social causados pela pandemia de Covid-19 tiveram muitos impactos sobre o meio ambiente. Positivos e negativos. Durante esse período, multiplicam-se fotos do pôr do sol e de praias que exibem um espectro inédito de cores. Também estão aparecendo animais silvestres que não costumavam se aproximar de áreas habitadas por homens. Bichos recuperando domínios perdidos? Eu mesmo já me surpreendi com tucanos e araras na minha vizinhança. Os noticiários mostram jacarés, pacas e lobos se deslocando em cidades pequenas ou invadindo residências.

Menos poluição do ar, sonora e visual. Mais vida e diversidade.

Até a qualidade do ar melhorou, sobretudo nas grandes cidades. Usamos menos energia elétrica, o que permitiu a recuperação dos níveis dos reservatórios de água. O consumo de gasolina baixou 35% e o de diesel, 25%. As emissões de carbono caíram 5.5% durante a pandemia - leia-se 2,5 bilhões de toneladas de CO2 a menos. Maravilha, não fosse o fato de a ONU estimar que seria necessária uma redução de 7,6% da emissão de CO2, por 10 anos seguidos, para evitar desastres ambientais...

E o efeito no meio ambiente é apenas um aspecto.

Obviamente, a perda de vidas humanas é a consequência mais lamentável. Mas ainda vamos conviver por algum tempo com os impactos na atividade econômica, o aumento do desemprego e seu desenrolar sociológico (escalada da violência doméstica, feminicídio, casos de divórcio, abandono de animais domésticos). E, no meio disso, fraudes para todos os gostos: superfaturamento na gestão da crise da saúde, malversação de recursos públicos, desrespeito às determinações para combater a evolução da pandemia por parte da população.

Minha desesperança atinge o limite, quando vejo comportamentos como o revenge buying, fenômeno que está lotando o comércio na retomada à normalidade de alguns países. Pensemos juntos: depois de tanta privação, sofrimento e reinvenção pessoal, tudo o que a gente sonha é simplesmente retomar a vida? Vamos descartar esse monte de lições, que pode nos levar a um outro patamar evolutivo, pra descer o lance de escadas que restabelece uma realidade que não nos representa mais?

Não sei exatamente o porquê, mas o filme Apocalypse Now, que tem a guerra do Vietnam como cenário, me veio à mente esses dias, como uma analogia ao que estamos vivendo. O que me toca em especial são as aparições de um Marlon Brando - vaga lembrança do que ele foi na juventude - no papel do Coronel Kurt. E, na sequência, me vêm também cenas de um mundo tipo Mad Max e todas essas produções com temática de fim de mundo.

Talvez um dia alguém faça um filme sobre 2020 – o ano que não aconteceu. Não tenho ideia de como será, mas as críticas que li sobre Apocalypse Now são bem apropriadas ao atual reality show da pandemia:

“Não é tanto sobre a guerra, mas sim como a guerra revela verdades que ficaríamos mais felizes em nunca descobrir”.

O planeta e as baratas sobreviverão à espécie humana.

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Colunista

Colunista Marcelo Nóbrega

Marcelo Nóbrega

Marcelo Nóbrega é especialista em Inovação e Tecnologia em Gestão de Pessoas. Após 30 anos no mundo corporativo, hoje atua como investidor-anjo, conselheiro e mentor de HR Techs. Executivo com experiência em empresas dos setores financeiro, de petróleo e gás, bens de consumo, serviço de transporte aéreo e alimentício. É especialista em coaching de executivos, gestão da mudança e desenvolvimento organizacional e de lideranças. Suas experiências profissionais incluem projetos de transformação de estratégia e cultura corporativa em empresas nacionais e multinacionais, tanto no Brasil, como na América Latina e nos EUA, no contexto de aquisições, fusões e spin-offs. É professor do Mestrado Profissional da FGV-SP e ministra cursos de pós-graduação nesta e em outras instituições sobre liderança, planejamento estratégico de RH, People Analytics e AI em Gestão de Pessoas. Entre outros reconhecimentos pela sua atuação como executivo, foi eleito o profissional de RH mais influente da América Latina e Top Voice do LinkedIn em 2018. É autor do livro “Você está Contratado!” e host do webcast do mesmo nome. É Mestre em Ciência da Computação pela Columbia University e PhD pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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