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7 min de leitura

A Dinâmica Evolucionária das Organizações

Gilberto de Souza

19 de Fevereiro

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Artigo A Dinâmica Evolucionária das Organizações

Um dos estudos mundiais mais encantadores e pragmáticos sobre como acontece o desenvolvimento biopsicossocial dos seres humanos adultos foi realizado pelo Prof. Clare Graves, contemporâneo de Abraham Maslow. 

Enquanto Maslow direcionou seus estudos para compreender as bases da motivação humana, criando o seu famoso esquema da hierarquia das necessidades, Clare Graves foi mais fundo, segundo o próprio Maslow, buscando compreender de onde emergia todas as escolhas humanas. De tão completo, profundo e abrangente, o modelo do Dr. Graves foi considerado "a teoria que explica tudo".  

Graves teorizou que o ser humano adulto pode se expressar por meio de oito faixas existenciais, com sistemas de pensamentos e de valores específicos que consideram a forma como a pessoa se define, se comporta e o que valoriza. 

Esse processo evolucionário pode ser melhor compreendido ao usarmos a metáfora de uma estrutura em espiral, em que cada faixa acima possui maior nível de complexidade, inclui a condição das faixas anteriores, e gera no indivíduo maior capacidade para enfrentar os desafios dos contextos que está inserido. 

Sucessor do Dr. Graves, Don Beck, professor doutor radicado no Texas e mentor de Nelson Mandela quando este assumiu a presidência da África do Sul, juntamente com seu aluno Chris Cowan, enriqueceram a abordagem do Dr. Graves, incluindo conceitos teóricos de estudos do Dr. Mihaly Csikszentmihalyi e do Dr. Richard Dawkins, o que permitiu a aplicação do modelo da Dinâmica em Espiral à gestão da complexidade social, organizacional e global de modo inovador. 

Com o objetivo de facilitar a memorização das características específicas de cada faixa existencial, Don Beck escolheu uma cor diferente para cada faixa, como pode ser visto abaixo.  

  • Fase 1: Bege – Instintivo

  • Fase 2: Púrpura – Tribalístico

  • Fase 3: Vermelho – Egóico

  • Fase 4: Azul – Transcendente

  • Fase 5: Laranja – Materialístico

  • Fase 6: Verde – Igualitário

  • Fase 7: Amarelo – Integrativo

  • Fase 8: Turquesa – Holístico 

O processo de alternância entre essas faixas de existência se dá por meio de duas grandes forças: 1) As condições de vida externa (informação, tecnologia, ecologia) e 2) as condições de vida interna (expressão genética, condição cerebral, neurotransmissores).

"O conceito da Dinâmica da Espiral explica que a natureza humana não é fixa. Temos as capacidades, na natureza de nosso cérebro, para construir novos mundos conceituais. O que tentamos descrever é como humanos são capazes de se adaptar às situações, criando pensamentos mais complexos para lidar com problemas novos.” — Dr. Don Beck

Assim como os seres humanos, as organizações também evoluem em fases existenciais diferentes, e, na medida em que vão aumentando o seu nível de complexidade e incluindo novos elementos em seu processo de estruturação (pessoas, processos, tecnologia e cultura), tornam-se mais aptas a continuarem relevantes para os seus stakeholders. 

Ao longo desses últimos vinte anos atuando com organizações nacionais e multinacionais, os pesquisadores da Nortus conseguiram mapear, nas organizações, quais são as nuances que caracterizam cada fase existencial.

Atualmente, já podemos identificar nove fases existenciais nas organizações. Ao conhecermos suas características, podemos identificar com agilidade os tipos de problemas que uma organização está enfrentando e os tipos de soluções que necessita, e também podemos prever o tipo de estruturação que precisará ser feita no futuro, bem como os problemas que a organização enfrentará se não tiver clareza disso.

Assim como nos seres humanos, o que determina a evolução nestas fases é um misto das condições externas (nível de complexidade do mercado de atuação - clientes, concorrentes e fornecedores, desenvolvimento social, econômico, modelo político, etc.) e das condições internas (nível de cognição e metacognição dos principais tomadores de decisão da organização somado à cultura da empresa e às condições econômicas e estruturais para incluir novas formas de atender às suas necessidades existenciais). 

Essas nove fases funcionam como um mapa detalhado para compreender por que uma organização se comporta de determinada forma, e como poderá se comportar no futuro mediante possíveis cenários mercadológicos que possam emergir no contexto contemporâneo. A complexidade, a incerteza e o caos de nossos contextos exigirão alta capacidade de auto-organização das organizações humanas, quer sejam estas empresariais ou não. 

Eis uma síntese das oito fases existenciais já mapeadas, e um possível preâmbulo da nona fase. Com esta informação, você pode começar a refletir sobre em que fase a sua organização se encontra. 

Fase 01 - Multitarefa

  • Todos fazem de tudo o que for preciso. 
  • Confusão de papéis.
  • Não há diferenciação entre estratégico, tático e operacional. 
  • Todos precisam ser tudo.

Fase 02 - Funcional

  • Papéis razoavelmente definidos. 
  • Nem sempre as pessoas certas estão nos lugares certos.
  • A organização simplesmente reage ao mercado.

Fase 03 - Entusiasta

  • A estratégia é crescer. 
  • As metas, muitas vezes, são traçadas sem fundamentações. 
  • A vontade é mais valorizada do que os fatos. 
  • O lema é "Acredita que dá" e "Vamos pra cima". 
  • Ser realista pode ser interpretado como pessimista.

Fase 04 - Estruturativa

  • Organizando a casa. 
  • Mapeando e estruturando processos e procedimentos. 
  • Implementação de indicadores e criação de políticas. 
  • Agora, não é apenas fazer o que precisa, mas fazer do jeito e na hora que precisa. 
  • A gestão começa a ter clareza do papel estratégico, tático e operacional.
  • As pessoas começam a chamar a estruturação de burocracia.

Fase 05 - Incremental 

  • Tudo pode ser melhorado.
  • Todos precisam ter metas e projetos.
  • Foco na última linha. 
  • Lucro é produto de ações inteligentes.
  • Meritocracia.
  • Diminuir o tempo, baixar os custos e melhorar a qualidade de todos os processos.
  • O cliente no centro da mesa.

Fase 06 - Colaborativa 

  • Propósito e valores inspiradores. 
  • Orgulho de pertencer. 
  • Cultura de inovação. 
  • Alto nível de colaboração. 
  • Mindfulness e sustentabilidade como ferramentas para incremento de produtividade.
  • Marketing de significado.

Fase 07 - Integrativa

  • Todos os sistemas precisam ser integrados.
  • Todas as ações precisam convergir com o posicionamento estratégico.
  • Tecnologia, cultura, estrutura e pessoas gerando sinergia e fluidez.
  • Minimalismo; apenas o essencial é essencial. 
  • Busca pelo zero desperdício.
  • Economia circular. 
  • Responsabilidade sistêmica.
  • Gestão integrada em seu mais alto nível de implantação.  

Fase 08 - Orgânica

  • Visão metassistêmica. 
  • Organizações auto-organizadoras, usam o caos e a complexidade para evoluir.
  • Rápida transformação frente às mudanças nos contextos políticos, econômicos, sociais e ambientais. 
  • Equipes autogerenciáveis. 
  • Oligarquia no lugar de hierarquias rígidas. 
  • Liderança em contextos no lugar de lideranças em funções. 
  • Não linearidade e não localidade presentes no modelo de negócio e na estruturação da organização.

Fase 09 - Holográfica 

  • Cada parte contém a informação do todo e toda ação é rastreável, o que faz com que as pessoas ajam como se fossem responsáveis pelo todo em cada decisão. 
  • Alto nível de confiabilidade das informações. 
  • A estrutura atômico-bio-psico-social dos seres humanos é percebida como parte da estrutura da organização. 
  • Não há tomada de decisão, há apenas conclusões naturais a partir de análises de contextos. 
  • Senso de separação gerado pelo ego é sutilizado.
  • O aumento da inteligência artificial poderá acelerar a necessidade desta fase nas organizações, uma vez que uma grande quantidade de informações será processada e transformada em conhecimento disponível para ler contextos. 
  • Ainda em construção das condições (tecnologias exteriores e interiores) que a viabilizem.

Como é possível perceber, trata-se de um modelo evolucionário em que, a cada fase, a organização aumenta as suas chances de ser ainda mais produtiva e de continuar viva em seu mercado de atuação. Ao evoluir para uma fase existencial de maior complexidade, as fases anteriores continuam disponíveis na organização. Trata-se de um movimento de transcendência e inclusão em que o novo é incluído, levando o sistema a um mais complexo padrão de funcionamento, mas conservando os aspectos positivos das fases anteriores.  

Ao longo desses 20 anos em que a equipe de pesquisadores da Nortus estuda o processo evolutivo das organizações, percebeu-se que as duas variáveis que mais podem acelerar ou desacelerar o processo evolutivo são o momento existencial do seu principal orientador de decisões e o nível de maturidade e complexidade do mercado em que a organização atua.

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Autoria

Gilberto de Souza

Sócio-fundador da Nortus e educador. Há mais de 20 anos atua na preparação de líderes. Ministrou palestras e cursos em eventos para mais de 200 mil pessoas e é co-autor do livro Organizações auto-organizadoras (2016), escrito em parceria com o médico neurocirurgião e P.h.D. Francisco Di Biase.

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